quinta-feira, 15 de setembro de 2011

TERMOGÊNICOS E DEFINIÇÃO MUSCULAR – PARTE 1


Quem não quer um abdome bem definido? Não estou falando em “barriga tanquinho”, mas, sim, uma barriga reta, sem protuberância e com músculos abdominais bem definidos. A procura por um abdome espetacular é tão grande que as revistas e comerciais valorizam isso todo santo dia em seus anúncios. Homens e mulheres, portanto, parecem ficar presos a esta espécie de “indústria dos espelhos”. Alguns pensam imediatamente em dietas radicais ou passar fome. Outros pensam em suar a camiseta, correndo feito “louco” nas praças da cidade. Ainda existem aqueles que pensam em lipoescultura. E, por fim, ainda existem aqueles que recorrem ao uso de suplementos esportivos e/ou medicamentos. Será que um abdome definido é coisa de atleta, modelo ou artista de televisão? Será que isso depende apenas de uma condição genética favorável? Uma coisa é certa: para ter um abdome definido você precisa investir em si mesmo e ter muita disciplina neste processo. A luta pode ser grande para alguns e curta para outros, mas com certeza sem autodisciplina você não chegará em lugar nenhum.


Nesta postagem, portanto, pretendo discutir os recursos ergogênicos nutricionais e farmacológicos para obter o tão sonhado abdome definido. Irei abordando nas postagens subseqüentes algumas estratégias para obter tal fim. Minha abordagem será mista, ou seja, técnica e científica (voltada aos profissionais e estudantes), bem como simples e explicativa (voltada ao púlico leigo), assim todos poderão usufruir dos conhecimentos aqui apresentados. Todavia, meu objetivo é informar e não estimular o consumo de suplementos e/ou medicamentos sem orientação profissional qualificada. Sabemos que, atualmente, existem muitas informações sobre o assunto, porém se você é leigo no assunto nunca saberá o quanto tem de “verdades” e “mentiras” nestas informações. Por este motivo, trago uma abordagem com informações científicas e sérias sobre este tema tão especulativo.


Enfim, a utilização de qualquer suplemento e/ou medicamento deve ser supervisionado pelo profissional nutricionista e médico. Todavia, por mais barrigudo que você esteja ou por mais gelatinosa que pareça sua barriga, seus músculos abdominais estão ai, embora que escondidos abaixo de uma camada de gordura. Assim, não seria ótimo você entender como enxergá-los novamente? Nesta primeira postagem sobre termogênicos e definição muscular, apresento o medicamento clembuterol.

RECURSOS ERGOGÊNICOS E DOPING

Entende-se por recurso ergogênico tudo aquilo que aprimora ou que se admite aprimorar o desempenho atlético, seja qualquer substância, processo ou procedimento. Portanto, um recurso ergogênico possui ação direta sobre a fibra muscular, fornece combustível necessário para a contração muscular, retarda os sintomas ou percepção da fadiga, neutraliza os produtos da fadiga, exerce efeitos sobre o coração e sistema circulatório ou neutraliza os efeitos inibitórios do sistema nervoso central (SNC) sobre a contração muscular, entre outras funções.


Os recursos ergogênicos, portanto, podem ser farmacológicos (esteróides anabólicos, clembuterol, sibutramina, por exemplo), nutricionais (carboidrato, proteína, lipídeo, vitaminas e minerais, água e eletrólitos), fisiológicos (oxigênio, condicionamento e técnica de recuperação), psicológicos (hipnose, sugestão e ensaios repetitivos) e mecânicos (aprimoramento da mecânica corporal, da vestimenta, do equipamento e do treinamento).


O Decreto de Lei nº 136/2003 de 28 de junho de 2003 estabelece, ainda, uma definição para suplemento alimentar, que seriam gêneros alimentícios que se destinam a complementar e/ou suplementar o regime alimentar normal e que constituem fontes concentradas de determinadas substâncias nutrientes ou outras com efeito nutricional ou fisiológico, estremes ou combinados, comercializados em forma doseada, tais como cápsulas, pastilhas, comprimidos, pílulas e outras fontes semelhantes, saquetas de pó, ampolas de líquido, frascos com conta-gotas e outras formas similares de líquidos ou pós que se destinam a ser tomados em unidades medidas de quantidade reduzida.


Algumas pessoas ainda recorrem ao uso de medicação para obter a definição muscular e, em particular, da região abdominal. Isso deveria ocorrer sob acompanhamento médico, pois trata-se de medicação, mas sabemos que nem sempre ocorre assim e efeitos colateriais podem existir. O conceito de medicamento pode ter várias atribuições, dependendo do contexto utilizado. Porém, a definição mais clara pela legislação brasileira diz que medicamento é toda a substância ou associação de substâncias, que possui propriedades curativas ou preventivas de doenças em seres humanos ou dos seus sintomas; ou que possa ser utilizada ou administrada no ser humano com vista em estabelecer um diagnóstico médico; ou exercendo uma ação farmacológica, imunológica ou metabólica a fim de restaurar, corrigir ou modificar funções fisiológicas. O objetivo do tratamento medicamentoso é prevenir, curar ou controlar doenças, essencialmente. Porém, por razões de excelência estética sabemos que as pessoas recorrem a administração de fármacos, prescritos ou não por profissionais de saúde. As questões legais e éticas sobre o assunto renderia mais uma postagem e, portanto, me dentenho apenas à proposta inicial desta postagem.


Não posso deixar de mencionar o Doping, pois alguns leitores podem ser atletas em competição. Neste sentido, Doping é a administração ou o uso, por parte de um atleta que está competindo, de qualquer substância estranha ao corpo ou de qualquer substância fisiológica tomada em quantidade anormal ou introduzida no organismo através de uma via de entrada anormal, com a única intenção de aumentar de uma maneira artificial e desleal seu desempenho numa competição. Quando a necessidade exige um tratamento médico com qualquer substância que, em virtude de sua natureza, dose ou aplicação, é capaz de aprimorar o desempenho do atleta na competição de uma maneira artificial e ilegal, isto deve ser considerado como doping.


Para obter maiores informações sobre suplementos e/ou medicamentos, lícitos ou ilícitos (proibidos para produção e comercialização por lei), você pode acompanhar a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA, www.anvisa.gov.br) e a World Anti-doping Agency (WADA, www.wada-ama.org). São inúmeras as substâncias presentes em diversos suplementos e medicamentos, o que torna humanamente impossível uma discussão criteriosa de todos. Porém, a grande parcela destes são estimuladores do sistema nervoso central (SNC), classificados em estimulantes psicomotores (que causam excitação, euforia, diminuem a sensação de fadiga e aumentam a atividade motora) e alucinógenos ou psicotomiméticos ou simpatomiméticos (que produzem alterações de raciocínio e humor e estimulam o sistema nervoso propriamente dito). Com base nisso, vejamos agora o clembuterol, um popular medicamento termogênico que vem sendo usado para acelerar o metabolismo e promover a queima de gordura. Estes também são chamados, algumas vezes, de fat burners.


CLEMBUTEROL

O clembuterol (CLEM) é um medicamento usado como broncodilatador para o tratamento de asma e bronquite crônica. Diz-se, também, que o CLEM é um fármaco beta-adrenérgico, lembrando que fármaco é a substância ou composto químico que é o princípio ativo do medicamento e, portanto, usado para fins medicinais. Todavia, atletas e não-atletas que buscam a definição muscular máxima têm usado o CLEM por finalidades puramente estéticas, o que pode representar um perigo a saúde.


No sistema nervoso simpático (SNS) há duas famílias (ou dois tipos) de receptores adrenérgicos para determinadas substâncias, designados em alfa e beta. Os receptores adrenérgicos (adrenorreceptores) do tipo beta, que interagem com o CLEM, ainda podem ser agrupados em beta-1 e beta-2, que possuem afinidades distintas, conforme as substâncias com que interagem. Os receptores beta-1, por exemplo, tem a mesma afinidade para epinefrina (adrenalina) e norepinefrina (noradrenalina), enquanto que o beta-2 possui maior afinidade para epinefrina. Veja, sua chave abre perfeitamente a porta de sua casa e, então, há um encaixe perfeito entre a chave e a fechadura de sua residência. Da mesma forma estou me referindo aqui, onde o CLEM (chave) se encaixa perfeitamente ao receptor-beta (fechadura).


O CLEM estimula os receptores beta-2-adrenérgicos, podendo levar a vasodilatação da musculatura lisa, leve redução da resistência periférica, broncodilatação, aumento da degradação de glicogênio hepático e muscular, aumento na liberação do hormônio glucagon e relaxamento da musculatura uterina. Todavia, o CLEM também estimula os receptores beta-1-adrenérgicos, que atuam sobre a musculatura cardíaca, causando taquicardia, aumento da contratilidade do miocárdio, aumento da mobilização de gordura do tecido adiposo (lipólise) e aumento na liberação da renina. A renina é uma enzima liberada pelos rins e provoca a ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona, envolvidos no equilíbrio do volume de líquido extracelular e pressão arterial. Com este relato inicial você já consegue perceber porque algumas pessoas se queixam de taquicardia, sudorese excessiva e tremores durante o uso de CLEM. Claro, também pode perceber que o CLEM realmente conduz a perda de peso e emagrecimento, o que seria útil para buscar o tão sonhado abdome espetacular.


Como vimos, o CLEM possui efeito lipolítico, ou seja, capaz de mobilizar a gordura do tecido adiposo. Bioquimicamente, quando o CLEM interage com os receptores beta-1-adrenérgicos promove a lipólise, ou seja, a hidrólise dos triglicerídeos localizados no tecido adiposo (em células conhecidas como adipócitos), formando ácidos graxos e glicerol. Os ácidos graxos, então, devem sofrer beta-oxidação na mitocôndria das células, como as mitocôndrias do tecido muscular. A beta-oxidação envolve a degradação do ácido graxo sempre no carbono beta, convertendo-o em um novo ácido graxo com dois carbonos a menos, ou seja, em acetil-CoA. Esta acetil-CoA será devidamente degradada no ciclo de Krebs (ou ciclo dos ácidos tricarboxílicos), gerando equivalentes de redução, como a nicotinamida-adenina-dinucleotídeo na forma reduzida (NADH) e a flavina-adenina-dinucleotídeo na forma reduzida (FADH2). Os equivalentes de redução (NADH e FADH2) são transportadores de elétrons de alta energia e serão encaminhados a cadeia respiratória mitocondrial, onde é gerado energia na forma de adenosina trifosfato (ATP). Traduzindo, a gordura do tecido adiposo ou da protuberância abdominal, como preferirem, será mobilizada e utilizada para gerar energia ao organismo, representando a redução do peso corporal e da adiposidade.


Você não deve esquecer que o CLEM também promove um aumento da degradação de glicogênio hepático e muscular, isso quando interage com receptores beta-2. O glicogênio é um polissacarídeo de reserva da célula animal e sua reserva é predominante no fígado e no músculo esquelético. A degradação do glicogênio hepático (glicogenólise hepática) tem a função de manter a glicemia, ou seja, de aumentar o “açúcar do sangue”. Já a degradação do glicogênio muscular (glicogenólise muscular) tem a função de sustentar o próprio músculo, sendo, portanto, “egoísta”, pois não empresta sua energia aos demais tecidos. A mobilização deste glicogênio, aparentemente, poderia representar uma perda de peso adicional, embora você devesse pensar em uma fadiga extra e desnecessária se o processo ocorrer de maneira exacerbada.


O CLEM promove um aumento na liberação do hormônio glucagon, através da interação com receptores beta-2-adrenérgicos. O glucagon é secretado pelas células alfa das Ilhotas de Langerhans pancreáticas. Trata-se do hormônio da hipoglicemia, ou seja, ele surge justamente quando os níveis de glicose do sangue encontram-se reduzidos. Seu objetivo hormonal, portanto, seria a capacidade de elevar a glicose do sangue (hiperglicemiante). Para tanto, o glucagon promove a glicogenólise hepática, justificando a descrição do parágrafo anterior. O glucagon não atua diretamente no músculo esquelético, embora a musculatura possa ser degradada (o que seria indesejável, pois implicaria em perda de massa muscular) pelo chamado equilíbrio dinâmico das proteínas teciduais, onde proteínas são desnaturadas e aminoácidos são liberados. Esta degradação de proteínas musculares ocorre no jejum prolongado, por exemplo. A interação do CLEM com receptores beta-2, como foi dito, poderia promover uma degradação do glicogênio muscular, o que antes ocorreria somente durante o esforço físico. A liberação de glucagon, estimulado por CLEM, também promove a lipólise e a beta-oxidação de ácidos graxos, o que justificaria a descrição do parágrafo anterior em relação ao emagrecimento promovido pelo fármaco. Em outras palavras, o CLEM estimula a liberação do glucagon e este promove essencialmente a mobilização de reservas glicídicas (glicogênio) e lipídicas (triglicerídeos).


Todavia, uso de CLEM associado às dietas inadequadas (hipocalóricas e hipoprotéicas, bem como pobres em carboidratos, vitaminas e minerais) conduzem a resultados insatisfatórios de estética corporal no final do processo, uma vez que a massa muscular torna-se comprometida durante a hiperglucagonemia (excesso na liberação de glucagon). Observem que o equilíbrio dinâmico das proteínas musculares encaminha aminoácidos do tecido muscular ao tecido hepático, onde os mesmos são convertidos em glicose através de uma rota bioquímica conhecida como gliconeogênese. Em outras palavras, em situações onde a glicemia é reduzida (por degradação excessiva de glicogênio hepático ou por erros dietéticos ou, simplesmente, por permanecer em jejum prolongado) os aminoácidos do tecido muscular são utilizados pelo fígado para produzir glicose, que será devidamente encaminhada ao sangue para alimentar os tecidos dependentes de glicose, como cérebro e eritrócitos (glóbulos vermelhos). Você deveria perceber, então, que o uso de CLEM com dieta inadequada apenas favorece a perda de massa muscular, cansaço, fadiga e prejuízo de saúde, onde o hormônio glucagon acaba dominando este cenário metabólico. O resultado na balança pode representar um baixo valor, mas isso seria à custa de massa muscular caso não haja uma boa nutrição. Isso verdadeiramente é bioquímica e não especulação!


Não podemos esquecer, ainda, os efeitos do CLEM sobre o sistema cardiovascular. A interação do CLEM com receptores beta-1-adrenérgicos conduz que a taquicardia e aumento da contratilidade do miocárdio. Ainda, sua interação com receptores beta-2-adrenérgicos garante um potente efeito broncodilatador. Isso pode conduzir a um aumento abrupto dos batimentos cardíacos e da pressão arterial que, em algumas situações, é desastroso a saúde. Vejamos, então, alguns efeitos colaterais do CLEM: nervosismo, tremores das mãos, cefaléia, enxaquecas, insônia, aumento da pressão arterial, taquicardias, náusea, vômitos, tonturas, infarto agudo do miocárdio (IAM), acidente vascular cerebral (AVC) e, até mesmo, óbito dependendo da dose administrada.


Não podemos negar que o CLEM funciona para o emagrecimento e definição corporal, favorecendo a formação de um abdome espetacular. Também é verdade que seus efeitos colaterais como taquicardia e tremores desaparecem após duas ou três semanas de uso. Mas não podemos ignorar seus efeitos colaterais. Minha intenção, como foi dito inicialmente, é apenas informar de maneira técnico-científica as estratégias de emagrecimento e definição muscular usado comumente por esportistas e atletas. Com base nisso, muitos devem estar se perguntando: Existe alguma dose segura? Posso obter resultados de definição muscular e evitar os efeitos adversos indesejáveis? Bem, continue lendo para tirar suas dúvidas.


Sabe-se que a exposição prolongada ao CLEM leva a dessensibilização dos receptores mencionados, o que levaria a menor obtenção de resultados esperados. Um erro comum seria aumentar a dosagem para voltar a obter resultados, porém um ou mais efeitos colaterais podem ser exacerbados. Desta forma, usualmente recorre-se ao uso interrompido de CLEM. Em outras palavras, os comprimidos de CLEM, por exemplo, possuem 0,02 mg e pode-se usar de 2 até 3 comprimidos ao dia, embora alguns usem até 6 comprimidos ao dia. Para evitar a dessensibilização de receptores, faz-se dois dias de uso (dia sim), seguido de dois dias de não uso (dia não). Obviamente a dosagem e o fechamento dos receptores dependem de cada indivíduo, o que deve ser estudado individualmente respeitando a individualidade biológica e os hábitos e estilo de vida do indivíduo. Da mesma forma, a dosagem deve ser gradual a fim de evitar um excesso desnecessário. As dosagens também costumam ser divididas e em horários diferentes, mas como uma regra geral não é usada próximo ao horário de dormir para evitar um sono perturbado ou insônia. Talvez por isso você vá observar algumas pessoas não usando CLEM depois das 17 horas do dia. Seu uso no pré-treino é discutível e controverso, onde usá-los no pré-treino pode significar um treino de qualidade ou vigoroso, enquanto que para outros pode significar uma sobrecarga cardíaca adicional.


É muito importante evitar a combinação de CLEM com outros termogênicos estimulantes do sistema nervoso central (SNC). Algumas pessoas fazem combinação com efedrina-cafeína-aspirina (ECA), mas isso pode representar uma verdadeira “bomba” a sua saúde. Além dos comprimidos, algumas pessoas partem para o CLEM em gel, cujo nome veterinário é Pulmonil Gel. Bem, como o nome diz é de uso veterinário e, portanto, sem comentários. Cabe lembrar novamente, que o uso de CLEM deve avaliado e realizado sob acompanhamento médico. Além disso, nenhum programa de treinamento, por mais excelente que seja, atingirá seus objetivos de emagrecimento sem uma boa nutrição. E nem mesmo o uso de CLEM fará milagres sem uma dieta equilibrada. Assim, a supervisão de um profissional nutricionista é essencial neste processo de excelência estética e, particularmente, na busca por um abdome reto e bem definido. Mas o CLEM, afinal, funciona? Claro que sim! E estarei correndo risco de saúde usando CLEM? Obviamente que sim! Como dito antes, minha intenção é informar! Para atletas, cabe lembrar que o uso de CLEM é considerado Doping. Para esportistas, cabe lembrar que mais estudos são necessários para que se possa recomendar seu uso em seres humanos.