segunda-feira, 8 de janeiro de 2018


VOCÊ REALMENTE TEM “INTOLERÂNCIA À LACTOSE” OU TÁ NA MODA “FREE LACTOSE”?

Não quero fazer uma apologia do leite (uma espécie de discurso apaixonado de defesa do leite), mas não posso acreditar que todos se tornaram intolerantes à lactose do dia para noite. Com base nisso, seguem meus comentários para suas próprias conclusões.

INTOLERÂNCIA À LACTOSE

Os indivíduos que apresentam “Intolerância à Lactose” (que é uma doença) relatam queixas de distensão abdominal, cólica, náusea, diarreia e flatulência, o que deve-se ao prejuízo na degradação de lactose. Lactose é o “açúcar do leite”, ou melhor, é um dissacarídeo formado por 1 unidade de glicose e uma 1 unidade de galactose, unidas por uma ligação glicosídica. A lactose ocorre naturalmente no leite e sua concentração pode variar de 0,1 até 7%. Na cavidade intestinal dos seres humanos, a lactose é degradada pela enzima lactase (beta-galactosidase), que rompe as ligações glicosídicas, liberando glicose e galactose. Todavia, alguns indivíduos não possuem lactase e, portanto, não degradam a lactose. Estes indivíduos são chamados de “Intolerantes à Lactose”. Já outros indivíduos possuem baixo teor da enzima lactase (deficiência) e, dessa forma, apresentam síndrome da má absorção ou má digestão da lactose pela capacidade reduzida da enzima na mucosa intestinal. Estes últimos são conhecidos como “Lactase não persistente” ou “Hipolactasia”. Alguns estudos apontam que os asiáticos e africanos apresentam alta incidência de Intolerância à Lactose, enquanto que outros estudos mostram que existem 30 até 50 milhões de norte-americanos com a doença. No Brasil, estima-se cerca de 40% da população. Todavia, também há estudos relatando que 70% da população mundial tem hipolactasia e não exatamente intolerância a lactose. Aí tá feito à confusão: você realmente tem “Intolerância à Lactose” ou “Hipolactasia” ou está apenas seguindo a moda “Free Lactose”? (Obs.: Nem venham me falar que leite "engrossa" a pele, pois isso me recuso em responder, rsrs).

DIAGNÓSTICO

O diagnóstico para “Intolerância à Lactose” é feito pela história clínica do paciente, relato de sintomas, história alimentar, nível de hidrogênio no hálito, níveis séricos de glicose após ingestão de lactose ou biópsia do intestino delgado. Vejamos um exemplo através do teste oral de tolerância à lactose ou LTT (Lactose Tolerance Test).

“Paciente 1” trouxe o seguinte exame:

Glicemia basal: 79 mg/dL
Deve-se somar 20 ao valor, ou seja, resultado = 99 mg/dL
A curva exibe:
30 min = 126 mg/dL
60 min = 90 mg/dL
90 min = 81 mg/dL

Qual o resultado? Negativo!

Por quê? Simples, se alguns dos números na curva (30, 60 e 90 min) for maior que o número basal acrescido de 20 (glicemia + 20) o paciente não é intolerante. Em outras palavras, considera-se normal a elevação da glicemia em relação ao jejum em pelo menos 20 mg/dL em qualquer das amostras. Se nenhuma das dosagens for maior que o número basal acrescido de 20 (glicemia + 20), então o paciente é intolerante à lactose.

Para facilitar, vejamos outros exemplos:

“Paciente 2”:
Glicemia basal = 91 mg/dL + 20 = 111 mg/dL
30 min = 108 mg/dL
60 min = 109 mg/dL
90 min = 100 mg/dL
Resultado? Positivo!

“Paciente 3”:
Glicemia basal = 75 mg/dL + 20 = 95 mg/dL
30 min = 98 mg/dL
60 min = 96 mg/dL
90 min = 92 mg/dL
Resultado? Negativo!

“Paciente 4”:
Glicemia basal = 81 mg/dL + 20 = 101 mg/dL
30 min = 92 mg/dL
60 min = 102 mg/dL
90 min = 100mg/dL
Resultado? Negativo!

Enfim, como você pode observar o diagnóstico através do LTT é bastante simples. Cabe lembrar que o leite materno possui lactose, além de energia ao recém-nascido, onde alguns bebês podem apresentar intolerância desde o nascimento. Cabe lembrar, também, que você pode nascer intolerante e, na fase adulta, não ser mais intolerante. Por quê? Não sei. Ainda, você pode ser intolerante à lactose em qualquer fase da vida (mesmo sem história familiar), o que deve-se ao declínio fisiológico com a idade avançada ou devido agressões à mucosa intestinal. Por quê? Não sei. Em outras palavras, nem tudo a ciência explica e, da mesma forma, eu não preciso saber todas as resposta para sentir a vontade de lhe ajudar ou compartilhar o que já tenho respostas.

DIETA E TRATAMENTO

Obviamente, o intolerante não tolera leite e derivados, uma vez que a ingestão de 5 até 12 g de lactose (100 até 200 ml de leite) já são suficiente para acarretar problemas, como expelir gases indesejáveis ou correr ao banheiro com diarreia. Quer dizer, segundo as tabelas nutricionais, cerca de 100 ml de leite de vaca contêm 4,9 g de lactose, enquanto que 100 ml de leite humano contêm 7 g de lactose. O tratamento, portanto, seria uma dieta isenta de lactose (leite e derivados, tais como iogurte, queijos, cremes, sorvetes, ovomaltine, alguns cafés instantâneos, bebidas de cacau, manteiga e requeijão) e produtos preparados com leite (bolos, biscoitos e misturas comerciais). Pode, se preferir, adotar a ingestão de extratos de soja sem lactose e fórmulas líquidas sem lactose, considerando as inúmeras ofertas de leite zero lactose no mercado brasileiro atualmente. Pode, também optar pelo consumo de cápsulas de lactase, caso queira participar de um encontro social com comilança contendo leite e derivados (mas sem exageros). A dieta também deve avaliar a necessidade da suplementação de cálcio, vitamina D e riboflavina (vitamina B2). (Obs.: Não estou dizendo que o leite é a melhor e única fonte de cálcio, muito pelo contrário, mas isso vou discutir em outro post).

MECANISMO BIOQUÍMICO DA DOENÇA

O mecanismo bioquímico é um tanto obscuro, mas fatores genéticos parecem estar envolvidos naqueles que nascem intolerantes. Pesquisadores da Finlândia, dirigidos pela Dra. Leena Peltonem, publicaram na Nature Genetics em 2002, que o gene LCT, que codifica a lactase-florizina hidrolase (ou, simplesmente, lactase) localiza-se no cromossomo 2q21. Todavia, como já relatado, a deficiência enzimática pode ter várias razões, incluindo defeito genético, declínio fisiológico e agressões à mucosa intestinal. De qualquer forma, a digestão inadequada da lactose, pela deficiência da enzima lactase, leva a uma absorção deficiente da mesma. Desta forma, a lactose não-digerida permanece por mais tempo na luz intestinal e, como possui alto poder osmótico, promove a passagem de líquidos para o tubo digestivo. Isso torna as fezes mais líquidas e explicaria a diarreia osmótica do paciente. As queixas são para fezes mais volumosas, espumosas, aquosas ou amolecidas. A diarreia, se não tratada, pode levar a um quadro de desidratação. Além disso, a permanência da lactose do tubo digestivo também favorece a fermentação da lactose por bactérias presente normalmente na flora intestinal. Estas bactérias convertem a lactose em ácido láctico e em outros ácidos orgânicos. Forma-se dióxido de carbono (CO2) e o gás hidrogênio (H2), bem como a geração de metano (CH4) e agentes orgânicos irritantes. Os gases produzidos pela fermentação poderia explicar a distensão abdominal e flatulência.

Então, posso tomar leite que traz benefícios a saúde humana? KEEP CALM (mantenha a calma), pois foi isso que eu disse, por acaso? Hehehe. Se você não entendeu o recado, então volte a primeira linha do texto, respire bem fundo e comece a reler novamente.

Para maiores detalhes ou diagnóstico clínico agende sua consulta.

Prof. Me. Nutr. Joelso Peralta
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