VOCÊ REALMENTE TEM “INTOLERÂNCIA À LACTOSE” OU TÁ NA
MODA “FREE LACTOSE”?
Não quero fazer uma apologia do leite (uma espécie
de discurso apaixonado de defesa do leite), mas não posso acreditar que todos se
tornaram intolerantes à lactose do dia para noite. Com base nisso, seguem meus
comentários para suas próprias conclusões.
INTOLERÂNCIA À LACTOSE
Os indivíduos que apresentam “Intolerância
à Lactose” (que é uma doença) relatam queixas de distensão abdominal, cólica, náusea, diarreia
e flatulência, o que deve-se ao prejuízo na degradação de lactose. Lactose é o “açúcar
do leite”, ou melhor, é um dissacarídeo formado por 1 unidade de glicose e uma 1 unidade
de galactose, unidas por uma ligação glicosídica. A lactose ocorre naturalmente no leite e sua
concentração pode variar de 0,1 até 7%. Na cavidade intestinal dos seres
humanos, a lactose é degradada pela enzima lactase (beta-galactosidase), que
rompe as ligações glicosídicas, liberando glicose e galactose. Todavia, alguns
indivíduos não possuem lactase e, portanto, não degradam a lactose. Estes indivíduos
são chamados de “Intolerantes à Lactose”. Já outros indivíduos possuem baixo
teor da enzima lactase (deficiência) e, dessa forma, apresentam síndrome da má
absorção ou má digestão da lactose pela capacidade reduzida da enzima na mucosa
intestinal. Estes últimos são conhecidos como “Lactase não persistente” ou “Hipolactasia”. Alguns estudos
apontam que os asiáticos e africanos apresentam alta incidência de Intolerância
à Lactose, enquanto que outros estudos mostram que existem 30 até 50 milhões de
norte-americanos com a doença. No Brasil, estima-se cerca de 40% da população. Todavia,
também há estudos relatando que 70%
da população mundial tem hipolactasia e não exatamente intolerância a lactose. Aí
tá feito à confusão: você realmente tem “Intolerância à Lactose” ou “Hipolactasia”
ou está apenas seguindo a moda “Free Lactose”? (Obs.: Nem venham me falar que leite "engrossa" a pele, pois isso me recuso em responder, rsrs).
DIAGNÓSTICO
O
diagnóstico para “Intolerância à Lactose” é feito pela história clínica do
paciente, relato de sintomas, história alimentar, nível de hidrogênio no
hálito, níveis séricos de glicose após ingestão de lactose ou biópsia do intestino
delgado. Vejamos um exemplo através do teste oral de tolerância à lactose ou LTT
(Lactose Tolerance Test).
“Paciente
1” trouxe o seguinte exame:
Glicemia basal:
79 mg/dL
Deve-se somar
20 ao valor, ou seja, resultado = 99 mg/dL
A curva
exibe:
30 min = 126
mg/dL
60 min = 90
mg/dL
90 min = 81
mg/dL
Qual o resultado?
Negativo!
Por quê?
Simples, se alguns dos números na curva (30, 60 e 90 min) for maior que o
número basal acrescido de 20 (glicemia + 20) o paciente não é intolerante. Em outras
palavras, considera-se normal a elevação da glicemia em relação ao jejum em
pelo menos 20 mg/dL em qualquer das amostras. Se nenhuma das dosagens for maior
que o número basal acrescido de 20 (glicemia + 20), então o paciente é
intolerante à lactose.
Para
facilitar, vejamos outros exemplos:
“Paciente 2”:
Glicemia basal
= 91 mg/dL + 20 = 111 mg/dL
30 min = 108
mg/dL
60 min = 109 mg/dL
90 min = 100 mg/dL
Resultado? Positivo!
“Paciente 3”:
Glicemia basal
= 75 mg/dL + 20 = 95 mg/dL
30 min = 98
mg/dL
60 min = 96 mg/dL
90 min = 92 mg/dL
Resultado? Negativo!
“Paciente 4”:
Glicemia basal
= 81 mg/dL + 20 = 101 mg/dL
30 min = 92
mg/dL
60 min = 102 mg/dL
90 min = 100mg/dL
Resultado? Negativo!
Enfim, como você pode observar o
diagnóstico através do LTT é bastante simples. Cabe lembrar que o leite materno
possui lactose, além de energia ao recém-nascido, onde alguns bebês podem
apresentar intolerância desde o nascimento. Cabe lembrar, também, que você pode
nascer intolerante e, na fase adulta, não ser mais intolerante. Por quê? Não sei. Ainda, você pode ser intolerante à lactose em qualquer fase da vida (mesmo
sem história familiar), o que deve-se ao declínio fisiológico com a idade avançada ou devido
agressões à mucosa intestinal. Por quê? Não sei. Em outras palavras, nem tudo a
ciência explica e, da mesma forma, eu não preciso saber todas as resposta para
sentir a vontade de lhe ajudar ou compartilhar o que já tenho respostas.
DIETA
E TRATAMENTO
Obviamente, o intolerante não tolera
leite e derivados, uma vez que a ingestão
de 5 até 12 g de lactose (100 até 200 ml de leite) já são suficiente para acarretar
problemas, como expelir gases indesejáveis ou correr ao banheiro com diarreia. Quer
dizer, segundo as tabelas nutricionais, cerca de 100 ml de leite de vaca contêm
4,9 g de lactose, enquanto que 100 ml de leite humano contêm 7 g de lactose. O tratamento,
portanto, seria uma dieta isenta de lactose (leite e derivados, tais como iogurte,
queijos, cremes, sorvetes, ovomaltine, alguns cafés instantâneos, bebidas de
cacau, manteiga e requeijão) e produtos preparados com leite (bolos, biscoitos
e misturas comerciais). Pode, se preferir, adotar a ingestão de extratos de
soja sem lactose e fórmulas líquidas sem lactose, considerando as inúmeras
ofertas de leite zero lactose no mercado brasileiro atualmente. Pode, também
optar pelo consumo de cápsulas de lactase, caso queira participar de um
encontro social com comilança contendo leite e derivados (mas sem exageros). A
dieta também deve avaliar a necessidade da suplementação de cálcio, vitamina D
e riboflavina (vitamina B2). (Obs.: Não estou dizendo que o leite é a melhor e única fonte de cálcio, muito pelo contrário, mas isso vou discutir em outro post).
MECANISMO BIOQUÍMICO DA DOENÇA
O
mecanismo bioquímico é um tanto obscuro, mas fatores genéticos parecem estar envolvidos
naqueles que nascem intolerantes. Pesquisadores da Finlândia, dirigidos pela
Dra. Leena Peltonem, publicaram na Nature Genetics em 2002, que o gene LCT, que
codifica a lactase-florizina hidrolase (ou, simplesmente, lactase) localiza-se
no cromossomo 2q21. Todavia, como já relatado, a deficiência enzimática pode
ter várias razões, incluindo defeito genético, declínio fisiológico e agressões
à mucosa intestinal. De qualquer forma, a digestão
inadequada da lactose, pela deficiência da enzima lactase, leva a uma absorção
deficiente da mesma. Desta forma, a lactose não-digerida permanece por mais
tempo na luz intestinal e, como possui alto poder osmótico, promove a passagem
de líquidos para o tubo digestivo. Isso torna as fezes mais líquidas e explicaria
a diarreia osmótica do paciente. As queixas são para fezes mais volumosas,
espumosas, aquosas ou amolecidas. A diarreia, se não tratada, pode levar a um
quadro de desidratação. Além disso, a permanência da lactose do tubo digestivo
também favorece a fermentação da lactose por bactérias presente normalmente na
flora intestinal. Estas bactérias convertem a lactose em ácido láctico e em
outros ácidos orgânicos. Forma-se dióxido de carbono (CO2) e o gás hidrogênio
(H2), bem como a geração de metano (CH4) e agentes orgânicos irritantes. Os
gases produzidos pela fermentação poderia explicar a distensão abdominal e
flatulência.
Então, posso tomar leite que traz
benefícios a saúde humana? KEEP CALM (mantenha a calma), pois foi isso que eu
disse, por acaso? Hehehe. Se você não entendeu o recado, então volte a primeira
linha do texto, respire bem fundo e comece a reler novamente.
Para maiores detalhes ou diagnóstico
clínico agende sua consulta.
Prof. Me. Nutr. Joelso Peralta
Tel./Whats: (51) 99943-1815
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peraltanutri.blogsot.comAtendimento em Porto Alegre/RS e Canoas/RS.