HIV – AIDS: Parte 2
Aspectos históricos. Situação
global. Transmissão. Sintomas. Diagnóstico. Ciclo viral. Medicamentos.
Perspectivas futuras.
JOELSO PERALTA, Nutricionista, Professor, Palestrante, Mestre em Medicina:
Ciências Médicas e Doutorando: PPG Farmacologia e Terapêutica - UFRGS.
Olá pessoal, tudo bem? Na “PARTE 1” discutimos, basicamente, os aspectos históricos do Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), o vírus da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA/AIDS), bem como apresentei alguns dados estatísticos referentes ao cenário global da doença. Na “PARTE 2” (final), o “textão” abordará o modo de transmissão, os sintomas, o diagnóstico e o ciclo viral do HIV. Também falarei, porém muito brevemente, dos medicamentos (terapia antirretroviral). Por fim, darei uma “pincelada” nas perspectivas futuras do HIV/AIDS. Lembre-se: se gostou pode compartilhar, desde que citado a fonte: Prof. Joelso Peralta (Blog: https://peraltanutri.blogspot.com) e siga-me nas redes sociais (@peraltanutri).
TRANSMISSÃO
O HIV, o vírus responsável pela AIDS, pode ser transmitido pelo sangue,
esperma e secreção vaginal, bem como leite materno ou transfusão de sangue
contaminado. O portador do HIV, mesmo sem apresentar os sintomas da AIDS, pode
transmitir o vírus. Quer dizer, você não deve confiar nos sintomas para saber
se tem HIV, pois existem pessoas convivendo com HIV por 2, 5, 10 anos ou mais
sem qualquer sintoma ou sintomas que podem ser confundidos como outras
enfermidades e doenças. Neste sentido, faz-se necessário o uso de preservativo
(camisinha) em todas as relações sexuais, afinal são 1,5 milhão de pessoas recém-infectadas pelo HIV em 2021. Os modos
de transmissão podem ser resumidos da seguinte maneira:
· Através de relações
sexuais:
· Heterossexuais;
· Homossexuais
masculinos (a transmissão entre mulheres é considerada rara, mas não nula).
· Exposição acidental
com sangue contaminado ou objetos/procedimentos relacionados com sangue:
· Transfusões de sangue;
· Uso de drogas
injetáveis, onde se compartilham seringas com sangue contaminado;
· Instrumentos
contaminados entre trabalhadores de saúde (por isso, “todo cuidado é pouco”).
NOTA: As práticas de tatuagens,
perfurações das orelhas e piercing, por exemplo, já foram apontadas como modos
de transmissão do HIV/IADS. Atualmente, desde que respeitadas os cuidados de
higiene e esterilização de instrumentos, são consideradas práticas seguras.
· Transmissão vertical
de mãe para filho:
· Gravidez
(intrauterina transplacentária);
· Parto (exposição ao
sangue materno);
· Aleitamento materno
(pós-parto).
· Doação de órgãos
NOTA: A doação de
órgãos é considerada uma forma de transmissão, embora rara, devido estratégias
de segurança e avaliação entre doador e receptor do órgão transplantado. Lembre-se
que, em 2019, um
doador HIV soropositivo (Nina Martinez, 35 anos) consegue doar um rim para um
receptor HIV soropositivo (nome não divulgado) nos Estados Unidos (https://www.virgula.com.br/saude/conheca-nina-martinez-a-primeira-doadora-de-orgaos-viva-com-hiv/).
Agora que vimos os modos de transmissão do HIV ou, comumente dito “como
se pega AIDS, precisamos falar de como “não se pega AIDS:
· NÃO SE PEGA AIDS com aperto de mão ou abraço;
· NÃO SE PEGA AIDS com beijo;
· NÃO SE PEGA AIDS por contato ocasional pessoa-a-pessoa em casa, no
trabalho ou em locais públicos ou sociais;
· NÃO SE PEGA AIDS usando os mesmo pratos, talheres e copos;
· NÃO SE PEGA AIDS usando sabonetes, toalhas ou lençóis;
·
NÃO SE PEGA AIDS por alimentos, ar ou água;
·
NÃO SE PEGA AIDS por picadas de insetos ou
mosquitos;
·
NÃO SE PEGA AIDS por tosse, espiro ou cuspidela;
·
NÃO SE PEGA AIDS através de piscinas ou
banheiros;
·
Enfim, NÃO SE PEGA AIDS doando e recebendo
CARINHO!
SINTOMAS
Quanto aos sintomas da AIDS, a literatura identifica três fases:
· Fase de infecção
aguda: surgem algumas semanas após contaminação (2-3 semanas) e incluem febre,
calafrios, cefaleias, dor de garganta e faringite, mialgias (dores musculares),
linfadenopatia (aumento no tamanho dos nódulos linfáticos ou ínguas) e
linfopenia (baixo nível de linfócitos no sangue, especialmente CD4+),
distúrbios gastrintestinais (náusea, vômito e diarreia), manchas avermelhadas
na pele (Rash), manchas brancas na
língua, boca e garganta, e perda de peso. Essa fase também é chamada de
Síndrome Retroviral Aguda (ARS) ou infecção primário, que corresponde à
resposta natural do organismo à infecção pelo HIV. Algumas pessoas, contudo,
não apresentam sintomas, mas podem contaminar outras pessoas. Neste período, os
linfócitos T CD4+ diminuem rapidamente, pois são atacadas e destruídas do HIV.
O sistema imune responde, aumentando a quantidade destes linfócitos. A
soroconversão, que é o momento em que uma pessoa soropositiva tem anticorpos
suficientes do HIV no sangue, capazes de serem detectados por testes, tem
duração de 3-12 semanas. Essa “janela” é importante na obtenção de diagnósticos
de infecção por HIV (https://unaids.org.br/estatisticas/);
· Fase de infecção
assintomática: essa fase tem duração variável (meses e anos), embora comumente
referido como sendo 10 anos ou mais. Também é chamada de “Infecção Crônica do
HIV” ou “Latência Clínica do HIV”. O HIV se reproduz em baixas taxas, mas a
pessoa pode transmitir o vírus. Com tratamento adequado (terapia antirretroviral,
por exemplo), os níveis de linfócitos T CD4+ tornam-se mais estáveis
(constantes), enquanto que a carga viral (quantidade de vírus presente em um
certo volume de sangue) é baixa. Em algum momento, contudo, os linfócitos caem
e a carga viral aumenta, onde o paciente começa a exibir e relatar alguns
sintomas, como veremos (https://unaids.org.br/estatisticas/);
· Fase da doença
sintomática: o sistema imunológico está debilitado e surgem
as doenças oportunistas, tais como tuberculose, pneumonia, herpes e candidíase (https://unaids.org.br/estatisticas/). Os sintomas da AIDS
podem se manifestar de em vários tecidos e órgãos: cérebro (toxoplasmose e Cryptococcal meningitis), olhos (Cytomegalovirus), boca e pescoço
(candidíase), pulmões (Pneumocistis
carinii, tuberculosis e histoplasmose),
intestino (Cytomegalovirus, Cryptosporidium, Mycobacterium avium complex), pele (herpes simples ou “cobreiro” e sarcoma
de Kaposi) e genitais (herpes genital, papilomavirus humano ou HPV e candidíase
vaginal). Na doença avançada ocorre queda brusca dos linfócitos T CD4+, correspondendo
a imunodeficiência severa.
É importante reforçar que em todas as três fases acima uma pessoa pode
transmitir o HIV para outra pessoa (https://unaids.org.br/estatisticas/).
NOTA 1: Rash são manchas vermelhas na pele, distribuídas pelo
corpo (tórax, pescoço, face, mãos e pés), apresentadas como lesões
arredondadas, menores que 1 cm, que ocorrem 48 a 72h após o início da infecção
pelo HIV. O sintoma pode durar 5 e 8 dias.
NOTA 2: Candidíase é uma infecção provocada pela Candida, que é um fungo.
Nas mulheres, um desequilíbrio da Candida
albicans na flora vaginal causa candidíase vaginal. Todavia, existem outros
tipos de candidíase, como candidíase masculina (balanopostite, ou seja,
inflamação da glande e prepúcio do pênis); candidíase da boca (comumente
chamada de “sapinho”, representada por pequenas aftas na boca e dificuldade
para engolir); candidíase do esôfago (a esofagite ocorre em pessoas
imunodeprimidas, como ocorre na AIDS e câncer); e candidíase na pele (conhecida
como intertrigo, onde uma micose se espalha pela virilha, axila, nádegas,
barriga, pescoço, entre os dedos e parte interna das coxas).
NOTA 3: O sarcoma de Kaposi (SK) é um câncer que se desenvolve nos vasos
sanguíneos, onde os acometidos exibem lesões na pele de coloração
vermelho-arroxeada ou amarronzada em qualquer região do corpo. Esse tipo de
câncer normalmente se desenvolve a partir do vírus da família do Herpes Vírus
Humano-8 (HHV-8), mas também em consequência da infecção pelo vírus HIV. O SK é
um tumor típico de pacientes imunossuprimidos.
NOTA 4: No estágio inicial, onde aparecem algumas doenças oportunistas (candidíase
e herpes zoster, por exemplo), o número de linfócitos T CD4+ estão abaixo de 500
células por milímetro cúbico de sangue (< 500 células/mm3), lembrando
que o valor de referência ou normalidade é de 1500 a 2500 células/mm3. No estágio avançado da doença, onde há
imunodeficiência será, além das infecções oportunistas (pneumonia, tuberculose
e toxoplasmose, por exemplo), os linfócitos estão abaixo de 200 células/mm3.
Quer dizer, o paciente progrediu do HIV para a doença AIDS.
DIAGNÓSTICO
Segundo UNAIDS (https://unaids.org.br/estatisticas/), não podemos confiar nos sintomas para
suspeitar de infecção pelo HIV, pois algumas pessoas simplesmente não exibem
sintomas ou exibem sintomas que podem aparecer em outras enfermidades (perda de
peso, tosse, febre, diarreia, manchas no corpo, etc.). Além disso, muitas
pessoas convivem 10 anos ou mais com a doença sem apresentar grandes sintomas,
especialmente com tratamento medicamentoso adequado. Neste sentido, o
diagnóstico é feito pela sorologia através do teste de anticorpos (ELISA) e
confirmado por Western Blotting. O clínico também irá avaliar sinais sugestivos
de infecção pelo HIV, como febre recorrentes, gânglios linfáticos aumentados,
garganta inflamada, erupção e manchas pelo corpo, fadiga profunda e sem
explicação.
CICLO VIRAL
A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA/AIDS) é uma doença
infecciosa causada pela Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), que leva a
perda progressiva da imunidade, resultando em infecções graves, tumores
malignos e, infelizmente, ao óbito. O HIV é
um retrovírus, ou seja, um vírus cujo material genético é o RNA (ácido
ribonucleico). Dessa forma, detalharei as características morfológicas do HIV
para facilitar o entendimento do ciclo viral. O HIV possui a seguinte
estrutura:
· Envelope proteico (Env): contendo as moléculas
gp120 e gp41, ligados a membrana lipídica (externa) do HIV. A glicoproteína
gp120 consegue interagir com receptores CD4 de linfócitos (RTCD4);
· Proteína de matriz: proteína p17;
· Cápsula proteica (capsídeo): camada proteica que
protege o RNA e enzimas;
· Fitas de ácido ribonucleico (RNA): possui duas fitas de
RNA, que são protegidas pelo capsídeo;
· Enzimas: protegidos pelo capsídeo, o HIV possui
transcriptase reversa (TR) e integrase. A TR permite a replicação viral (RNA viral
para DNA viral), enquanto que a integrase auxilia na integração do DNA viral ao
DNA humano, como veremos;
Com base nisso, podemos entender como funciona o ciclo viral do HIV, que
didaticamente foi dividido em 8 etapas:
O ciclo viral do HIV
envolve a fusão do envelope viral com a membrana dos linfócitos T CD4+. Esse
processo é facilitado pela proteína gp41 do HIV, mas a interação ocorre entre a
proteína gp120 do HIV com os receptores CD4 de linfócitos (RTCD4) (ETAPA 1). Após fusão, o capsídeo é
rompido, onde ocorre a liberação do RNA viral, transcriptase reversa (TR) e
integrase (ETAPA 2). Em seguida, no
citoplasma, ocorre transcrição reversa do RNA viral para o DNA viral pela transcriptase
reversa (TR) (ETAPA 3). Algum RNA
viral pode ser degradado, enquanto que o DNA viral é incorporado no núcleo dos
linfócitos com auxílio da integrase (ETAPA
4). A partir daí, ocorre a transcrição de um novo RNA mensageiro (RNAm
viral) pela RNA polimerase a partir do DNA viral, que foi incorporado no DNA
humano (ETAPA 5). No citoplasma, o
RNAm (viral) codifica proteínas virais (gp120, gp41, TR e integrase) (ETAPA 6). As proteínas virais
recém-sintetizadas (gp120 e gp41) se inserem na membrana plasmática dos
linfócitos para a montagem do virion,
que é a partícula viral madura (ETAPA 7).
Finalmente, ocorre brotamento e liberação do virion que, agora circulante, pode contaminar outros linfócitos T
CD4+ (ETAPA 8).
NOTA: Existem coadjuvantes no ciclo viral do HIV, além da interação
gp120 (do HIV) com RTCD4 (dos linfócitos), tais como CCR5 e CXCR4. Também
existem outras proteases. Todavia, meu objetivo foi simplificar o ciclo viral
que é descrito na maioria dos livros didáticos. De qualquer forma, na infecção
avançada ocorre linfopenia (redução no número de linfócitos) com depleção de
linfócitos T CD4+. Os linfócitos T CD4+ (linfócitos T-auxiliares) coordenam a
resposta imunológica e estimulam a produção de anticorpos por linfócitos B
(estes produzem anticorpos). Dessa forma, o HIV deixa o organismo extremamente
debilitado do ponto de vista imunológico, facilitando as doenças oportunistas.
Cabe lembrar que os linfócitos T-citotóxicos (CD8+) reconhecem antígenos (corpos
estranhos ou agente invasor) e destroem as células infectadas por apoptose
(morte celular programada). Todavia, ambos atuam de forma integrada na chamada
IMUNIDADE ADAPTATIVA OU ADQUIRIDA, que se encontra debilitada pela AIDS.
MEDICAMENTOS
Aqui, meu objetivo não será discutir todos os medicamentos e
antirretrovirais disponíveis para o tratamento do HIV/AIDS (aliás, não tenho
tempo, nem conhecimento, para abordar os mesmos). Dessa forma, vou limitar
minha explicação destacando que as drogas antirretrovirais atuam suprimindo a
replicação viral (viremia), o que preserva ou mantém constante os níveis de
linfócitos T CD4+. Os medicamentos na terapêutica do HIV/AIDS podem atuar de
inúmeras maneiras: inibindo a fusão do HIV aos linfócitos CD4; inibindo a
transcriptase reversa (TR) e integrase; inibindo a síntese de proteínas virais
(gp120 e gp41); e inibir o brotamento/liberação dos virions à circulação. Claro, uma grande parte do tratamento se
baseia no uso de antirretrovirais (ARV), o que pode prolongar a qualidade de
vida e expectativa de vida dos pacientes, bem como diminuir as chances de
transmissão. Não existem vacinas para AIDS, o que será explicado, em breve,
pois algumas pessoas acreditam em Teorias Conspiracionistas, especialmente salientada
na pandemia de Covid-19. Por fim, geralmente faz-se combinação de ARV, que
parece ser o padrão-ouro de tratamento atual.
PERSPECTIVAS FUTURAS
QUAL O FUTURO
NO TRATAMENTO DO HIV/AIDS?
Finalmente, chegamos aos tempos atuais, onde convivemos com HIV/AIDS e,
ao mesmo tempo, pandemia de SARS-CoV-2/Covid-19. Quer dizer, HIV/AIDS não
desapareceu, mas as pessoas parecem que só falam de Covid-19 (o que é
compreensível). Qual o futuro no tratamento do HIV/AIDS é uma pergunta difícil
de responder, pois as perspectivas podem ser BOAS e RUINS. Como assim? Deixa-me
explicar:
PERSPECTIVAS BOAS: a ciência evoluiu muito e podemos estar próximos
de uma “cura” para AIDS, o que provavelmente será uma combinação de terapia
antirretroviral, transplante de medula óssea e células-tronco e vacinas.
PERSPECTIVAS RUINS: vivemos na “Era Fake News” (notícias falsas),
onde algumas mentiras e “bobagens” são compartilhadas sem qualquer critério de
seleção, raciocínio lógico e, claro, sem qualquer escrúpulo.
Com base nisso, surge a pergunta: Por que não temos, em pleno 2022,
vacinas para HIV/AIDS de forma tão rápida quanto ocorreu com Covid-19?
Alguns preferem responder com abordagens conspiracionistas, mas vou me
limitar aos aspectos científicos, que poderá ser melhor entendido se você reler
o capítulo do ciclo viral do HIV. Resumidamente, quatro (04) fatos explicam
essa pergunta:
(1) O HIV é um retrovírus, ou seja, um vírus cujo material genético é o
RNA. Além disso, os retrovírus possuem a enzima transcriptase reversa (TR), que
converte RNA viral em DNA viral. Os coronavírus, como o SARS-CoV-2 (novo
coronavírus), são membros da família Coronaviridae,
que são vírus de RNA simples, sem transcriptase reversa (TR). Em outras
palavras, o HIV pode se incorporar no DNA do hospedeiro;
(2) O sistema imunológico não se cura do HIV, mas nosso sistema imune
responde ao SARS-CoV-2. Quer dizer, na Covid-19, causada pelo SARS-CoV-2, nosso
sistema imune reage e combate o coronavírus. Já na AIDS, causada pelo HIV, o
vírus é “invisível”. Em outras palavras, o HIV se esconde, por longos períodos,
no sistema linfático (nódulos linfáticos), enfraquecendo o sistema imunológico.
Além disso, no sangue, o vírus pode ser “invisível”, pois encontra-se dentro
dos leucócitos;
(3) O SARS-CoV-2, por exemplo, possui dezenas de variantes, enquanto que
HIV tem centenas e milhares de variantes. Atualmente, discute-se sobre a
atualização de vacinas para o novo coronavírus, então imaginem para centenas e
milhares de HIV?;
(4) O novo coronavírus (SARS-CoV-2) ataca os pulmões e outros órgãos,
provocando uma resposta inflamatória grave. O HIV enfraquece o sistema
imunológico, ou seja, provoca imunodeficiência. Como criar vacinas para
fortalecer o sistema imune, que não responde efetivamente ao HIV?
Enfim, as vacinas para HIV, diferentemente daquelas para coronavírus,
precisam vencer estes obstáculos para se tornarem viáveis. Obviamente, o
investimento financeiro neste campo de pesquisa faz-se necessário (e não
adianta criticar a BigPharma, pois verdadeiramente não são instituições
filantrópicas). Ao mesmo tempo, alguns pesquisadores admitem que a criação de
uma vacina para combater o HIV/AIDS pode estar próxima, mas concordam que a profilaxia
(isto é, aplicação de medidas preventivas para a preservação da saúde) sempre
será necessária.
E, VOCÊ, QUE
NÃO É PESQUISADOR OU CIENTISTA, O QUE PODE FAZER NO CENÁRIO HIV/AIDS?
A resposta mais simples seria: aprenda sobre os modos de transmissão e mantenha
todos os cuidados necessários para evitar a transmissão do HIV, responsável
pela AIDS. Contudo, tenho outra dica: não compartilha Fake News e não de créditos
aos negacionistas de plantão. Deixa-me exemplificar:
Algum tempo atrás foi compartilhado nas redes sociais que o Nobel de
Medicina, o Dr. Luc Montagnier (sim, aquele que falamos na Parte 1), teria dito
que o novo coronavírus (SARS-CoV-2) teria surgido em laboratório e causaria
AIDS. Em seguida, outras pessoas compartilhavam em suas redes sociais que
vacinas para Covid-19 causariam AIDS. Pronto: o pânico foi instalado na
população leiga. Deixa-me, contudo, explicar.
Primeiro, francês Dr. Luc Montagnier é médico e virulogista, ganhador do
Prêmio Nobel de Medicina em 2008, em decorrência de seus estudos com HIV, o
vírus da AIDS. Dr. Montagnier realmente causou polêmica afirmando que o SARS-CoV-2
teria sido criado em laboratório chinês, mas jamais disse que o novo
coronavírus causa AIDS, o que são coisas diferentes. Quer dizer, o médico não
acredita no surgimento natural do novo coronavírus em “mercados úmidos” (feiras
livres chineses) e, embora respeitamos sua opinião, cabe lembrar que a ciência diz
que Dr. Montagnier estava equivocado (em outro post posso discutir a origem do
SARS-CoV-2). De qualquer forma, parece que a “opinião pessoal” (ou seja, baixo
grau de evidência científica) ganhou força entre “negacionistas” e adoradores
das Teorias Conspiracionistas, afinal é uma pessoa de renome falando. Pois bem,
pouco tempo depois descobriu-se que a “opinião pessoal” do Dr. Montagnier pode
ter como base a leitura de um estudo da Escola de Ciências Biológicas Kusuma,
localizada no Instituto Indiano de Tecnologia, na Índia, publicado no site
bioRxiv. O estudo (Prashant Pradhan et al. Uncanny similarity of unique inserts in the
2019-nCoV spike protein to HIV-1 gp120 and Gag) relata existir uma estranha semelhança
entre a proteína spike (proteína S) do novo coronavírus com a glicoproteína
gp120 e Gag do HIV-1. Porém, cabe relembrar que o site bioRxiv é um repositório
de pré-impressão (preprint) de acesso
aberto de estudos NÃO REVISADOS POR PARES, ou seja, que passam apenas por uma
triagem básica para evitar plágio. Os preprints
são “manuscritos” científicos depositados pelos autores em servidores públicos
(livre acesso), não revisador por pares, tais como bioRxiv e medRxiv. Os preprints possuem introdução,
metodologia, resultado e conclusão, tem “cara” de artigo científico, mas
trata-se apenas de um “manuscrito” que EU, VOCÊ ou QUALQUER PESSOA poderia
escrever, mas que podem ou não se tornar uma publicação científica. Uma grande
parcela dos preprints são desmentidos
pela ciência, enquanto que outros jamais são publicados por erros
metodológicos. A falta de revisão por pares (uma “espécie de controle de
qualidade”) sobre a metodologia científica pode acarretar problemas sérios
nestes “manuscritos” e influenciar negativamente os leitores. A comunidade
científica, por exemplo, analisou e relatou que o estudo lido pelo Dr.
Montagnier possui inúmeros erros metodológicos e de interpretação,
estabelecendo conclusões equivocadas e falsas. Este estudo, por sua vez, foi
retirado pelos autores da plataforma bioRxiv, devido grande número de críticas
e, ATÉ HOJE, não retornou a plataforma com as devidas correções/revisões. Por
outro lado, o estrago já foi feito, ou seja, as pessoas continuam citando o estudo
excluído da plataforma e colocando palavras não ditas na boca do Dr.
Montagnier. Segundo a epidemiologista PhD Gowri Gopalakrishna, em entrevista na
Medscape: “A ciência errada, tendenciosa e preguiçosa está sendo amplificada
pelas mídias sociais”. De acordo com Dra. Gowri, os preprints podem fazer parte do problema, especialmente quando se
trata de intervenções e tratamentos no cenário da pandemia (https://portugues.medscape.com/verartigo/6505145).
Segundo, algumas pessoas se apoiam no "Argumentum ad verecundiam", que é uma expressão em latim
para se referir ao “ARGUMENTO DE AUTORIDADE”, para defender suas ideias, que
nem são suas. Para tanto, a “falácia lógica” (ou ilógica) quando perde a força
em um debate, apela para as palavras de uma autoridade ou pessoa de grande
reputação, mesmo sem apoio da comunidade científica. O “VIÉS DE AUTORIDADE” ou “FALÁCIA
DE AUTORIDADE”, agora, busca dar uma basta na discussão, pois tem uma
autoridade presente no contexto. Porém, cabe lembrar que os grandes Gênios da
Ciência também erraram, incluindo Albert Eintein, Linus Pauling e Charles
Darwin. Dessa forma, como disse Augusto Cury, psiquiatra, professor e escritor
brasileiro: “De Gênio e Louco todo mundo tem um pouco”. Em outras palavras, em
um primeiro momento, obviamente, você deve dar atenção a “autoridade”, afinal
deve ser alguém que dedicou sua vida estudando tal assunto. Por exemplo, seu
“Genivalson” (nome fictício), embora tenha boa oratória, diz que a terra é
plana, mas não pode provar. Já a senhora “Mariamonrosen” (nome fictício), que é
astrofísica, diz que a terra é redonda e tem dados na NASA (National Aeronautics and Space
Administration, Administração Nacional de Aeronáutica e Espaço) para provar.
Neste caso, devemos acreditar na Sra. Mariamonrosen, pois além de autoridade
(astrofísica), ela fez algo fantástico: TROUXE AS PROVAS!
Meu recado final, portanto, seria:
É importante verificar se as informações, geralmente divulgadas em redes
sociais, são verdadeiras ou falsas antes de sair compartilhando. Ao mesmo
tempo, não devemos inverter o ônus da prova, ou seja, o autor da “falácia” (ilógica)
deve provar o que diz e não argumentar que está baseado em sua “experiência de
vida”, “experiência clínica” ou “feeling”
(impressão baseada em sentimentos, sensações, pressentimentos ou vivências). Lembre-se:
liberdade de expressão é diferente de compartilhar Fake News, que pode causar
danos irreparáveis à uma população.
Lembre-se:
se gostou pode compartilhar, desde que citado a fonte: Prof. Joelso Peralta (Blog:
https://peraltanutri.blogspot.com) e siga-me nas redes sociais (@peraltanutri).