quarta-feira, 3 de agosto de 2022

HIV – AIDS: Parte 1

 

HIV – AIDS: Parte 1

 Aspectos históricos. Situação global. Transmissão. Sintomas. Diagnóstico. Ciclo viral. Medicamentos. Perspectivas futuras.

 

JOELSO PERALTA, Nutricionista, Professor, Palestrante, Mestre em Medicina: Ciências Médicas e Doutorando: PPG Farmacologia e Terapêutica - UFRGS.

 

Olá pessoal, tudo bem? Recentemente foi noticiado que um indivíduo pode ter sido curado do Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV, Human Immunodeficiency Virus), o vírus responsável pela Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA ou AIDS, Adquired Immunodeficiency Syndrome), após transplante de célula-tronco. Outro caso já havia sido noticiado, onde um indivíduo se curou da AIDS após transplante de medula óssea. Com base nisso, pensei em fazer um “textão” sobre HIV/AIDS. Vamos lá, pegue sua água, chá, chimarrão ou café, pois será um “textão”. Aliás, será um “textão” em duas partes, sendo a “Parte 1” apresentada agora. Lembre-se: se gostou pode compartilhar, desde que citado a fonte: Prof. Joelso Peralta no Blog: https://peraltanutri.blogspot.com. Ahhh, siga-me nas redes sociais (FACE: Joelso Peralta; Instagram: @peraltanutri).

 

ASPECTOS HISTÓRICOS

1884-1924 (Mundo)

Acredita-se que em algum lugar da África Central, entre 1884 e 1924, um caçador de chimpanzé (e macaco verde africano) se contaminou com o sangue do animal, contendo um vírus, provavelmente através de uma ferida aberta em seu corpo (https://www.webmd.com/hiv-aids/ss/slideshow-aids-retrospective). No animal, o suposto vírus não é letal, mas “pulou” (“jumping”) de chimpanzés (e macaco-verde africano) para seres humanos e se espalhou (após mutação gênica) na região. Atualmente sabe-se que os animais tinham, na realidade, o Vírus da Imunodeficiência Símia (SIV), que sofreu mutação para o HIV (Vírus da Imunodeficiência Adquirida) (AIDS e sua origem. Editorial. Revista de Saúde Pública 27(3): 1993; https://doi.org/10.1590/S0034-89101993000300001). Enfim, é a “Teoria do Caçador”, mundialmente aceita para explicar a origem do HIV/AIDS, desde que acrescida o “pulo” (jumping) e mutações que o vírus sofreu com o passar do tempo, como se fosse uma espécie de “seleção natural” para favorecer o vírus.

1959 (Mundo)

Em 1959, o HIV (não era chamado assim, como veremos) é encontrado em amostra sanguínea de um homem africano da etnia Bandu, que viveu em Leopoldville, que foi renomeada para Kinshasa (Quinxassa), e pertence a República Democrática do Congo, na África Central. Os cientistas recriaram uma árvore genealógica para o vírus e acreditam que uma cepa chegou aos EUA, via Haiti, entre 1960 e 1969 (http://news.bbc.co.uk/2/hi/health/7068574.stm).

1978 (Mundo)

Homossexuais nos EUA e heterossexuais na Tanzânia e no Haiti começam a apresentam sintomas da AIDS, relatado como inabilidade do sistema imune reagir as infecções e doenças. A doença ainda não havia sido identificada.

1980-1981 (Mundo)

A doença foi detectada na África e EUA, ganhando repercussão de epidemia em 1980 e 1981. Dessa forma, muitos acreditam que a doença começou nessa época, mas na realidade foi denominada de epidemia, nos EUA, devido ao grande número de casos e relatos de pacientes, adultos, do sexo masculino, homossexuais, moradores de São Francisco e Nova York, que apresentavam sinais de debilidade do sistema imunológico, deixando o indivíduo vulnerável as doenças oportunistas, tais como: Sarcoma de Kaposi (SK) e pneumonia causada pelo Pneumocystis carinii. Os hospitais, nos EUA, relataram 41 casos de pacientes jovens com sarcoma de Kaposi, que é um câncer raro em pacientes jovens, se manifestando, quase sempre, em idosos com imunidade debilitada (25 Anos de AIDS. Revista Superinteressante; https://super.abril.com.br/saude/25-anos-de-aids/). A doença desconhecida foi chamada (erroneamente e de forma preconceituosa) de “câncer gay”. Em seguida, foi denominada (novamente erroneamente) de “Gays Related Imuno Deficience” (Imunodeficiência Relacionada aos Gays, GRID). Nos anos seguintes, a doença se espalhou entre homens heterossexuais e mulheres, onde a sigla GRID não tinha mais lógica para se manter.

04 de junho de 1981 (Mundo)

O médico imunologista Michael Stuart Gottieb (nascido em 1947) e colaboradores publicam, no boletim do Centro de Controle de Doenças (CDC) dos EUA, um relato de que uma nova doença estaria causando a falência do sistema imunológico de pacientes. Gottieb e colaboradores identificaram que a condição imunológica (imunodeficiência) favorecia a infecção por citomegalovírus, pneumonia, candidíase e sarcoma de Kaposi (SK). Em 4 de junho de 1981, o CDC relata que um câncer de pele incomum (sarcoma de Kaposi, SK) estava levando ao óbito homens jovens, previamente saudáveis, em Nova York e na Califórnia. Em dezembro de 1981, a New England Journal of Medicine publica um estudo, do Dr. Gottieb e colaboradores, incluindo a primeira descrição da deficiência de linfócitos T CD4+ na doença desconhecida. Neste estudo, denominado “Pneumocystis carinii pneumonia e candidíase mucosa em homens homossexuais previamente saudáveis: evidência de uma nova imunodeficiência celular adquirida (Gottlieb MS et al. Pneumocystis carinii Pneumonia and Mucosal Candidiasis in Previously Healthy Homosexual Men -Evidence of a New Acquired Cellular Immunodeficiency. Engl. J. Med. 305 (24): 1425-31, 1981; doi: 10.1056/NEJM198112103052401), quatro (04) homossexuais previamente saudáveis contraíram Pneumocystis carinii (pneumonia), candidíase mucosa extensa e múltiplas infecções virais. Destes, três (03) apresentaram febre prolongada de origem desconhecida. O sarcoma de Kaposi (SK) se desenvolveu em um paciente. No mesmo ano, um grupo de homossexuais de Nova York, liderados por Rodger Allen McFarlane (1955-2009), inaugura um serviço de informações sobre a AIDS pelo telefone. O ativista Roger McFarlane, líder do movimento pelos direitos dos homossexuais, morreu aos 54 anos, onde relata-se ter sido suicídio (https://www.nytimes.com/2009/05/19/nyregion/19mcfarlane.html). No final de 1981, já haviam 337 casos de imunodeficiência (deficiência imunológica) nos EUA e, destes, 130 evoluíram ao óbito (https://www.webmd.com/hiv-aids/ss/slideshow-aids-retrospective).

1982 (Brasil e Mundo)

A dermatologista paulista Valéria Petri, da Escola Paulista de Medicina, identifica o primeiro caso de AIDS no Brasil (https://www.oexplorador.com.br/o-primeiro-caso-de-aids-no-brasil/). Em janeiro de 1982, a comunidade científica certifica-se que o vírus (HIV) é transmitido por meio do sangue e do contato sexual. A partir daí, surge a definição de grupos de risco. Em junho do mesmo ano é registrado o primeiro caso de AIDS por meio de transmissão de sangue em hemofílico sexual nos EUA. O Centro de Controle de Doenças (CDC) dos EUA batiza a nova doença de AIDS (Aquired Immune Deficiency Syndrome), comumente também chamada de SIDA (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida) (https://www.webmd.com/hiv-aids/ss/slideshow-aids-retrospective). Pesquisadores discordam que AIDS teria surgido em Leopoldville, agora Kinshasa (África Central), em 1959, mas, sim, em Uganda, no leste da África, em 1976.

NOTA: Hemofilia é um distúrbio hereditário que afeta a coagulação do sangue, ou seja, genes defeituosos não permitem a formação de algumas proteínas da cascata de coagulação do sangue (fator VIII = hemofilia A, que corresponde a 80% dos casos; e fator IX = hemofilia B), resultando em hemorragias. Dessa forma, a reposição destes fatores se dá pela transfusão de sangue, ou melhor, pela substituição dos fatores de coagulação deficientes por fatores eficientes (fatores de coagulação purificado do sangue do doador).

1983-1986 (Mundo)

Em 1983 o agente etimológico foi identificado: tratava-se de um retrovírus humano (vírus de RNA), atualmente denominado Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV-1). Na época, contudo, foi denominado Vírus Associado a Linfadenopatia (LAV). Também, no passado, foi denominado Vírus T-linfotrópico Humano Tipo III (HTLV-III). Em 1986, foi identificado um segundo agente etimológico, também retrovírus, estreitamente relacionado ao HIV-1, denominado HIV-2. Embora as origens dos HIV-1 e HIV-2 sejam polêmicas e gerem discussões, sabemos que as grandes famílias dos retrovírus estão presentes em primatas da África sub-Sahariana e possuem estruturas genômicas semelhantes aos HIV-1 e HIV-2. Todos, aliás, têm a capacidade de infectar linfócitos através de receptores CD4 de linfócitos (RCD4). O HIV-1, contudo, parece mais virulento do que o HIV-2. Numerosos retrovírus de primatas não-humanos encontrados na África têm mostrado grande similaridade com o HIV-1 e com o HIV-2. Como já dissemos, o Vírus da Imunodeficiência Símia (SIV), presentes em chimpanzés e macacos-verdes africanos, são semelhantes ao HIV-1/HIV-2. Dessa forma, acredita-se o vírus “pulou” (“jumping”) de primatas para seres humanos, onde sofreu mutação gênica, evoluindo para o HIV atualmente conhecido (AIDS e sua origem. Editorial. Revista de Saúde Pública 27(3): 1993; https://doi.org/10.1590/S0034-89101993000300001; Origem da epidemia de HIV. Brasil Escola; https://brasilescola.uol.com.br/doencas/origem-epidemia-de-hiv.htm).

NOTA: Os linfócitos são células brancas (leucócitos), agranulócitos (sem grânulos), que atuam na linha de defesa contra infecção viral ou surgimento de tumores. Existem vários tipos de linfócitos, onde se destacam os linfócitos B e linfócitos T. Os linfócitos B são responsáveis pela produção de anticorpos. Os linfócitos T podem ser classificados em linfócitos T-auxiliares (também chamados de CD4+) e linfócitos T-citotóxicos (também chamados de CD8+). Os linfócitos CD4+ coordenam a resposta imunológica do organismo e estimulam as ações dos linfócitos B, enquanto que os linfócitos CD8+ reconhecem patógenos através de receptores específicos e destroem células infectadas (induzem a apoptose, que seria a “morte celular programada”). Os linfócitos B e T fazem parte da Imunidade Adquirida ou Adaptativa. Os demais leucócitos (monócitos, neutrófilos, eosinófilos e basófilos) participam da Imunidade Inata ou Natural.

01 de fevereiro de 1983 (Mundo)

A equipe do Instituto Pasteur, na França, chefiada por Luc Montaigner (1932-2022) e Françoise Barre-Sinoussi (nascida em 1947, hoje com 75 anos), identificam o vírus causador da doença, batizando-o de Vírus Associado a Linfadenopatia (LAV). Os pesquisadores isolaram o vírus do gânglio linfático de um paciente, um jovem homossexual francês com AIDS, que apresentava ínguas pelo corpo. Todavia, o pesquisador americano Robert Gallo, do Instituto Nacional de Saúde dos EUA, foi quem primeiro publicou a descoberta do vírus, chamando-o de vírus T-linfotrópico humano tipo III (HTLV-III), ou seja, pertencente à família de vírus que atacam o sistema imunológico, particularmente os linfócitos T (https://drauziovarella.uol.com.br/infectologia/a-descoberta-do-virus-da-aids-artigo/). Quer dizer, antes de ser conhecido como HIV, o vírus foi chamado de LAV (Vírus Associado a Linfadenopatia) e, até mesmo, de HTLV-III (Vírus T-linfotrópico Humano Tipo III).

NOTA: Hoje sabe-se que HTLV e HIV, embora sejam retrovírus (vírus de RNA), não são iguais. HTLV, que também é transmitido por relação sexual desprotegida ou sangue contaminado (transfusão e compartilhamento de seringas e agulhas), não causa AIDS. O HTLV-I está associado as doenças neurológicas e degenerativas (paraparesia espástica tropical) e hematológicas, incluindo a leucemia e o linfoma de células T humana do adulto (ATL). O HTLV-II não é completamente entendido, mas sugere-se que HTLV-I invade linfócitos T CD4+ e HTLV-II invade linfócitos T CD8+. Enfim, o termo HTLV-III foi substituído por HIV, onde o termo “oficial” foi consolidado somente em 1986.

04 de junho de 1983 (Brasil)

Morre, em Nova York, aos 31 anos, por complicações da AIDS, o estilista e figurinista mineiro Markito (Marcus Vinícius Resende Gonçalves, 1952-1983), conhecido como o “costureiro das atrizes de televisão e socialites”. Ele foi a primeira pessoa pública brasileira a falecer por causa da doença, o que gerou grande repercussão e medo. O dermatologista Paulo Roberto Teixeira inaugura o primeiro programa de prevenção à AIDS como parte do Instituto de Saúde da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo (https://www.douradosnews.com.br/dourados/doutor-paulo-roberto-teixeira-e-personalidade-do-dourados-news-80ac0e2/215387/). Ao mesmo tempo, as mulheres começam a apresentar AIDS, conferindo que a doença não se limitado aos homens homossexuais (https://www.webmd.com/hiv-aids/ss/slideshow-aids-retrospective). Cresce a preocupação: o HIV pode passar para a criança durante a gravidez ou logo após o parto? O HIV pode passar de pessoa-pessoa em atividades domésticas de contato diário?

25 de junho de 1984

O filósofo francês Michel Foucault (1926-1984) morre aos 58 anos, em Paris, em consequência da AIDS. Em outubro, o laboratório americano Abbot começa a testar o primeiro teste sorológico para detectar a presença do vírus no organismo, o Eliza (Enzima Imuno Ensaio). Pesquisadores americanos consideram o comissário de bordo canadense Gaetan Dugas (1952-1984), falecido aos 34 anos, o “paciente zero da AIDS”, cujo alegação foi desconsiderada e considerada incorreta em 2016 (https://pt.wikipedia.org/wiki/Ga%C3%ABtan_Dugas).

1984 (Brasil)

A travesti Brenda Lee (Cícero Caetano Leonardo, 1948-1996) passa a frequentar os corredores do Hospital Emílio Ribas, em São Paulo, exigindo um tratamento digno para os doentes de AIDS. Neste ano, foi criada a “Casa de Apoio Brenda Lee”, instituição particular para doentes de AIDS. Em 28 de maio de 1996, aos 52 anos, Brenda Lee foi brutalmente assassinada, com um tiro na boca e outro no peito, e teve seu corpo abandonado em um terreno baldio. Entre 1984 e 1985, o Brasil (e outros países) viveram uma espécie de “Histeria da AIDS”, inclusive com perseguição e morte de gays e pessoas contaminas pelo HIV (https://pt.wikipedia.org/wiki/Brenda_Lee).

NOTA: Travesti se vestem com roupas femininas, tem desejo pelo sexo oposto, mas mantém o órgão genital masculino. Já transexual nascem homem, mas não se sentem como tal e, portanto, realizam a cirurgia de mudança de sexo.

1985 (Brasil)

Morre o ator norte-americano Rock Hudson (1925-1985), considerado um galã dos anos 1950 e 1960. Segundo seus colegas, contudo, a homossexualidade de Hudson era conhecida em Hollywood. Sua morte por AIDS causou grande repercussão, especialmente porque Hudson deixou uma certa fortuna para a financiar as pesquisas relacionadas à AIDS através da Fundação Americana para a Pesquisa da Aids (amfAR) (https://www.webmd.com/hiv-aids/ss/slideshow-aids-retrospective).

1987 (Brasil)

Os pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz, no Brasil, isolaram o HIV pela primeira vez. Ao mesmo tempo, o medicamento Zidovudina (AZT), usado inicialmente no câncer, é usado para o tratamento da AIDS (https://www.webmd.com/hiv-aids/ss/slideshow-aids-retrospective).

NOTA: Zidovudina (AZT), sintetizado em 1964, foi a primeira droga aprovada para o tratamento da infecção do HIV/AIDS. Inicialmente, AZT foi elaborado para o tratamento do câncer, mas em 1974 havia indícios de seu uso antiviral, devido experimentos in vitro com cultura de retrovírus de ratos. Em 1987, a FDA (Food and Drug Administration), agência reguladora dos EUA, aprova o AZT para uso no HIV/AIDS (https://pt.wikipedia.org/wiki/Zidovudina).

1988 (Mundo)

Food and Drug Administration (FDA), agência reguladora dos EUA, libera o uso de algumas drogas, ainda em fase de estudos clínicos, para tratamento de pessoa com AIDS. Ao mesmo tempo, cientistas descobrem que o vírus (HIV) circula no sangue, atacando e reduzindo a imunidade, muito antes do aparecimento dos sintomas da AIDS. O tratamento, portanto, se baseiam em manter a contagem dos linfócitos T circulantes. A Organização Mundial de Saúde (OMS) reconhece 1º de dezembro como o Dia Mundial de Combate à AIDS, celebrada anualmente desde 1988 (https://www.webmd.com/hiv-aids/ss/slideshow-aids-retrospective).

09 de julho de 1990 (Brasil)

Morre aos 32 anos, no Rio de Janeiro, no dia 07 de julho de 1990, o cantor, compositor e poeta brasileiro Cazuza (Agenor de Miranda Araújo Neto, 1958-1990), vítima da AIDS (https://history.uol.com.br/hoje-na-historia/morre-o-cantor-e-compositor-cazuza).

NOTA: Cazuza, junto com a banda Barão Vermelho, deixou músicas inesquecíveis no cenário musical: “Todo Amor que Houver Nessa Vida”; “Pro Dia Nascer Feliz”; “Maior Abandonado”; “Bete Balanço”; e “Bilhetinho Azul”. Na sua carreira solo, deixou outras tantas músicas imortais: “Exagerado”; “Codinome Beija-Flor”; “Ideologia”; “Brasil”; “Faz Parte do meu Show”; “O Tempo não Para”; e “O Nosso Amor a Gente Inventa”.

1991-1992 (Mundo e Brasil)

O laço vermelho torna-se um símbolo da consciência sobre a AIDS. O atleta de basquetebol, estrela do Los Angeles Lakers, Earvin “Magic” Johnson anuncia que é portador do vírus do HIV, bem como anuncia sua aposentadoria imediata. Sua esposa e filho testaram negativo para HIV. Magic Johnson relatou que iria combater a “doença mortal” e criou o Magic Johnson Foundation. O ex-atleta dizia que as pessoas heterossexuais também estavam em risco. Em 24 de novembro de 1991 morre o cantor, pianista e compositor Freddie Mercury (1946-1991), da banda Queen, aos 45 anos, outra vítima da AIDS (https://www.webmd.com/hiv-aids/ss/slideshow-aids-retrospective). Surgem os primeiros testes rápidos para detectar o HIV, enquanto que no Brasil, AZT (zidovudina ou azidotimidina) é usado no Sistema Único de Saúde (SUS).

1993-1994 (Mundo e Brasil)

O Presidente Bill Clinton (William Jefferson "Bill" Clinton, nascido em 1946, atualmente com 76 anos) lança o Escritório de Política Nacional de AIDS da Casa Branca (https://www.webmd.com/hiv-aids/ss/slideshow-aids-retrospective). As propagandas anunciam o uso de preservativos (camisinhas descartáveis de látex) como forma de prevenção da transmissão do HIV. Com isso, também se evita as doenças sexualmente transmissíveis (DST). O AZT (zidovudina ou azidotimidina) começa a ser produzido no Brasil.

NOTA: Algumas pessoas eram resistentes ao uso de camisinha, na época, alegando ser um “limitador da qualidade do ato sexual”. Essa teoria fantasiosa foi vencida pela educação sexual e preocupação em não se contaminar com HIV. Aliás, cabe uma dica de filme: o ator Tom Hanks interpretando Andrew Beckett, no filme Filadélfia, de 1993. O filme é fantástico, onde Andrew Beckett é um promissor advogado, que trabalha em um escritório na Filadélfia, quando descobre ser portador do vírus (HIV). A partir daí, Andrew é demitido da empresa e contrata os serviços do advogado Joe Miller (interpretado pelo ator Denzel Washington), que se mostra inicialmente homofóbico e/ou preconceituoso. Durante o julgamento e desenrolar do filme, Joe Miller (o advogado) enfrenta seus próprios medos e preconceitos e, peraí, assistam ao filme.

1996-1997 (Mundo e Brasil)

A ciência avançou no estudo do HIV/AIDS, onde surgem os primeiros coquetéis (AZT, zidovudina + Didanosina, ambos inibidores da transcriptase reversa, TR). O coquetel foi capaz de reduzir a taxa viral para níveis quase indetectáveis no sangue, reduzindo em 40% as mortes por HIV/AIDS (https://www.webmd.com/hiv-aids/ss/slideshow-aids-retrospective). As terapias antirretrovirais (ARV) prometiam reduzir as cargas virais do HIV para níveis indetectáveis, eliminando o vírus do corpo. Essa hipótese para os ARV não estava completamente correta, pois descobriu-se que o vírus se “escondia” ou ficava “dormente” em células do sistema imune e sistema linfático. Em 09 de agosto de 1997 morre, aos 62 anos, o sociólogo brasileiro Herbert de Souza (1935-1997), mais conhecido como Betinho. Betinho foi acometido pelo HIV após uma transfusão de sangue.

1998-2000 (Mundo)

 Os antirretrovirais (ARV), medicamentos utilizados para o tratamento de infecções causadas por retrovírus, especialmente HIV/AIDS ganham força, mas o relato de efeitos colaterais, alguns graves, também são documentados. Os pesquisadores confirmam: essas drogas não curam a AIDS. Surgem, também, os ARV capazes de inibidores de protease do vírus, além dos ARV tradicionalmente inibidores da transcriptase reversa (TR).

NOTA: O Dogma Central da Biologia Molecular, proposto com Francis Crick em 1958, diz: “O DNA dirige a sua própria replicação e sua transcrição para produzir RNA, o qual dirige a sua tradução para formação de proteínas”. Em outras palavras, nosso DNA (ácido desoxirribonucleico) pode se replicar numa reação catalisada pela DNA polimerase para dar origem a novas moléculas de DNA e pode ser transcrito para RNA (ácido ribonucleico) pela RNA polimerase, isto é, ocorre transferência de informações codificadas do DNA ao RNA. O RNA, por sua vez, traduz o código genético em proteínas específicas. Neste sentido, a transcrição gênica é um processo nuclear (onde as informações do DNA são repassadas ao RNA) e a tradução gênica é um processo citoplasmático (onde as informações do RNA dão origem as proteínas específicas recém-sintetizadas). O processo dessa reação pode ser resumido: DNA >>> RNA >>> proteínas. Todavia, os retrovírus (vírus de RNA) possuem uma enzima chamada transcriptase reversa (TR), que consegue realizar a transcrição inversa da reação mencionada, ou seja, produzindo DNA a partir de RNA. Esse é um mecanismo fascinante, porém igualmente preocupante, pois o RNA viral consegue ser usado de molde para a fabricação do DNA em nossas células, permitindo a reproduzir e multiplicação do vírus HIV, por exemplo. Neste sentido, muitos antirretrovirais buscam, justamente, inibir a transcriptase reversa (TR), enzima presente em retrovírus e não em seres humanos.

2001-2002 (Mundo)

 A AIDS se torna a principal causa de morte em todo o mundo, o que foi anunciado pela Organização das Nações Unidas (ONU) (https://www.webmd.com/hiv-aids/ss/slideshow-aids-retrospective).

2003 (Mundo)

 O Presidente George Walker Bush ou, simplesmente, Bush, anuncia o Plano de Emergência do Presidente, destinando bilhões de dólares para o tratamento da AIDS (https://www.webmd.com/hiv-aids/ss/slideshow-aids-retrospective).

2006-2007 (Mundo)

O alto investimento para o tratamento da AIDS surtiu efeitos positivos, pois as pessoas que conviviam com HIV/AIDS relatavam maior qualidade de vida e expectativa de vida (https://www.webmd.com/hiv-aids/ss/slideshow-aids-retrospective). Surgem algumas pesquisas no sentido de combater a AIDS através da criação de vacinas. Em 2006, Timothy Ray Brown, conhecido como “Paciente de Berlim”, é considerado a primeira pessoa a ser “curada” da infecção do HIV/AIDS no mundo. Timothy, que tinha HIV, também teve o diagnóstico de leucemia. De maneira inédita, Timothy recebeu um transplante de um paciente com resistência natural ao HIV, em 207, onde o vírus (HIV) sumiu, enquanto que a leucemia permaneceu (https://www.cnnbrasil.com.br/saude/paciente-de-berlim-primeiro-homem-curado-do-hiv-enfrenta-cancer-terminal/). Em julho de 2012, Timothy fundou a Fundação Timothy Ray Brown, em Washington, para combate ao HIV/AIDS e faleceu em 29 de setembro de 2020 (aos 54 anos), devido complicações da leucemia (https://en.wikipedia.org/wiki/Timothy_Ray_Brown).

NOTA: Leucemia é um tipo de câncer, “doenças dos glóbulos brancos” ou “câncer de leucócitos”, onde ocorre acúmulo de células imunes doentes na medula óssea e no sangue. Os valores normais de leucócitos oscilam entre 4.000 e 11.000 células/mL, enquanto que na leucemia podem atingir 50.000 células/mL ou mais. O número aumentado de leucócitos chama-se leucocitose.

2008 (Mundo)

O CDC, dos EUA, relatou que o HIV estava altamente difundido na América (1,1 milhão de infectados), ou seja, observou-se um aumento de 11% em relação aos 5 anos anteriores. Neste ano, Luc Montagnier e Françoise Barre-Sinoussi (mencionados anteriormente) finalmente ganharam o Prêmio Nobel de Medicina pela descoberta do HIV (https://www.webmd.com/hiv-aids/ss/slideshow-aids-retrospective).

2012-2013 (Mundo e Brasil)

FDA (Food and Drug Administration) aprova o uso de Tenofovir/Entricitabina como profilaxia pré-exposição ao HIV (PrEP), que são associações de medicamentos para o tratamento e prevenção do HIV, cujo objetivo é prevenir novas infeções em pessoas de alto risco. A PrEP prometia reduzir o risco de contrair o HIV, pela relação sexual, em cerca de 99%; e reduzir o risco de contrair as injeções em cerca de 74% (https://www.webmd.com/hiv-aids/ss/slideshow-aids-retrospective). A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), do Brasil, libera o uso do Truvada (combinação de Tenofovir + Entricitabina) para profilaxia do HIV/AIDS. CDC, dos EUA, define que pessoas com “Carga Viral Indetectável” não transmite o HIV.

NOTA: A carga viral é um exame que mede a quantidade de vírus presente em um certo volume de sangue. Neste sentido, quanto maior o valor da carga viral, maior é a quantidade de vírus (HIV). O exame de carga viral, portanto, é fundamental para avaliar a adesão e a eficiência do tratamento antirretroviral (ARV). Em março de 2013, o primeiro caso bem documentado de uma criança infectada pelo HIV que parece estar curada do HIV se torna público, embora pesquisadores alertam para análises de longa data para confirmação (https://br.rbth.com/ciencia/2013/03/04/cura_de_crianca_com_hiv_requer_anos_de_analise_dizem_medicos_17923). Esse assunto foi explorado em outra matéria, onde a criança – apelidada de “O Bebê do Mississipi” –, filho de uma mãe HIV soropositivo, não mostrou sinais de contaminação pelo HIV. Para tanto, o tratamento antirretroviral (ARV) começou logo ao nascer (https://www.webmd.com/hiv-aids/ss/slideshow-aids-retrospective). Alguns anos depois (cerca de 2 anos, embora a informação é controversa), o vírus retornou na criança, que havia mudado de estado e equipe médica, mostrando que o HIV pode se comportar diferentes entre bebês, crianças, adultos e idosos.

2016-2017 (Mundo e Brasil)

Em 2016, o CDC, dos EUA, atualiza as recomendações de tratamento para profilaxia pós-exposição ao HIV e fortalece os conceitos de grupo de risco. Novos e promissores medicamentos surgem. Em 2017, a Fundação Bill e Melinda Gates investe pesado para o desenvolvimento de um implante, que poderiam fornecer de forma constante os medicamentos PrEP (profilaxia pré-exposição ao HIV) para pessoas com HIV (https://www.webmd.com/hiv-aids/ss/slideshow-aids-retrospective).

2019 (Mundo)

Em 2019, um doador HIV soropositivo consegue doar um rim para um receptor HIV soropositivo nos Estados Unidos. Nina Martinez, 35 anos, tornou-se a primeira pessoa com HIV a doar um órgão (receptor não teve sua identidade divulgada), o que ocorreu no Johns Hopkins Hospital, em Maryland, Estados Unidos (https://www.virgula.com.br/saude/conheca-nina-martinez-a-primeira-doadora-de-orgaos-viva-com-hiv/). Este fato tira todo um estigma sobre os pacientes com HIV, ou seja, a doença não é mais uma “sentença de morte” e muitas pessoas com HIV vivem normalmente por longos anos. Martinez e o receptor anônimo mantém os medicamentos ARV, bem como monitoram as condições de saúde. 

2020 (Mundo)

Em 2020, um homem, conhecido como “Paciente de Londres”, é anunciado como o 2º caso de “cura” da AIDS. O paciente foi “curado” da doença após receber um transplante de medula óssea de um homem que possuía uma mutação genética, tornando-o resistente ao vírus (https://super.abril.com.br/ciencia/quem-e-o-segundo-paciente-curado-de-infeccao-por-hiv/).

2021-2022 (Mundo)

Em 2022, uma mulher com HIV recebeu um transplante de células-tronco e noticiários dizem que é o 3º caso de remissão da AIDS. Quer dizer, a mulher não apresentou níveis detectáveis do vírus nos últimos 14 meses, embora mantenha a terapia antirretroviral (TARV) (https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/Saude/noticia/2022/02/cientistas-relatam-3-caso-de-remissao-do-hiv-com-celulas-tronco.html). Também em 2022, um paciente de 66 anos, diagnosticado com HIV, foi considerado curado após receber transplante com células-tronco para tratar leucemia. Quer dizer, o paciente recebeu transplante para curar a leucemia, mas curiosamente acabou se curando da AIDS. O paciente mantinha, por mais de 30 anos, a terapia antirretroviral (ARV). Os pesquisadores, contudo, pedem cautela em usar o termo “cura da AIDS”, pois os pacientes precisam ser monitorados. De qualquer forma, o paciente está 17 meses com carga viral indetectável. Este é considerado o 4º caso de “cura” da AIDS (https://veja.abril.com.br/saude/medicos-anunciam-novo-caso-de-cura-da-aids/).

NOTA: Relembrando, os quatro casos de “cura” da AIDS foram: 2006 – “Paciente de Berlim” (Timothy Ray Brown); 2020 – “Paciente de Londres” (identidade divulgada posteriormente: Adam Castillejo); 2022 – Mulher que recebeu transplante de células-tronco (nome não divulgado); e 2022 – Home que recebeu transplante com células-tronco (nome não divulgado). Ainda em 2022, recentemente, foi divulgado uma quinta pessoa curada da AIDS, conhecida como “Paciente do City of Hope” (nome não divulgado), na Califórnia, EUA. O paciente teria recebido um transplante de medula óssea.

SITUAÇÃO GLOBAL

Atualmente, 38,4 milhões de pessoas estão vivendo com o HIV, o vírus causador da AIDS, segundo dados estatísticos do Relatório Global 2022 do UNAIDS (https://unaids.org.br/estatisticas/). Calcula-se que 36,7 milhões são pessoas adultas e 1,7 milhões são crianças. Ainda, 54% de todas as pessoas vivendo com HIV são mulheres e meninas. Além disso, 1,5 milhão de pessoas se tornaram recém-infectadas pelo HIV em 2021, onde 650 mil pessoas morreram por doenças relacionadas à AIDS no mesmo ano. O pico de infeção parece ter ocorrido em 1996, onde foram 32 milhões de pessoas recém-infectadas. Estima-se que 85% de todas as pessoas vivendo com HIV sabiam de sua contaminação, mas 5,9 milhões de pessoas não sabiam que viviam com o HIV em 2021. Por fim, segundo UNAIDS, US$ 21,4 bilhões estavam disponíveis para a resposta contra a AIDS em países de baixa e média rendas, mas estima-se que são necessários US$ 29 bilhões até 2025. Portanto, precisamos, SIM, continuar falando de HIV/AIDS.

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