terça-feira, 25 de junho de 2024

O AÇÚCAR PODE VICIAR?


O AÇÚCAR PODE VICIAR? 

JOELSO PERALTA, Nutricionista, Professor, Palestrante, Mestre em Medicina: Ciências Médicas e PhD Student in Biological Sciences: Pharmacology and Therapeutics, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)


Olá pessoal, tudo bem?

Com grande frequência observamos nas mídias sociais e meios de comunicação de massa as seguintes frases: 

“Açúcar causa dependência química igual a cocaína”.

“Açúcar vicia 8 vezes mais que cocaína”.

“Açúcar é um vilão”.

“Açúcar é responsável pelo diabetes e obesidade”.

“Açúcar vicia porque promove liberação de dopamina no cérebro”.

“Açúcar torna o indivíduo dependente igual ao cigarro”.

E por aí segue (...).

 

Com certeza já escutou as frases acima, não é mesmo?

Com base nisso, pergunto:

O AÇÚCAR PODE VICIAR?

Não quero sair em defesa do açúcar, o que seria um despautério, mas quero limitar minha discussão em uma abordagem reflexiva e científica sobre o “vício do açúcar”. O que são FATOS e o que não passam de FAKE NEWS? Vem comigo, vamos REFLETIR.

 

PRIMEIRA REFLEXÃO:

Os carboidratos e açúcares são apontados como verdadeiros vilões do controle de peso e emagrecimento. Estes vilões, malfeitores, bandidos, seriam responsáveis pelo diabetes e obesidade. Todavia, as pessoas sabem a diferença entre carboidratos e açúcares? Como assim? Sim, nem todo carboidrato é um açúcar, embora todo açúcar seja um hidrato de carbono. Deixa-me fazer algumas perguntas para você pensar:

1. Batata inglesa e batata-doce são carboidratos simples ou complexos?

2. Arroz branco e arroz integral são carboidratos simples ou complexos?

3. Maçã e melancia são carboidratos simples ou complexos?

4. Afinal, o que são carboidratos simples e complexos?

5. Você sabe a diferença entre índice glicêmico e carga glicêmica?

6. Será que não está confundindo carboidratos simples com índice glicêmico?

7. Um carboidrato simples pode ter alto ou baixo índice glicêmico?

8. Um carboidrato complexo pode ter alto ou baixo índice glicêmico?

9. O que são monossacarídeos, oligossacarídeos e polissacarídeos? Me dê alguns exemplos?

10. Qual diferença química entre sacarose e amido?

 

E aí, pensou?

Sabe todas as respostas?

Em minha experiência como professor e palestrante, posso te afirmar que muitas pessoas, incluindo estudantes e profissionais de saúde, vão errar uma ou mais das perguntas acima. Os leigos na ciência da nutrição, por sua vez, errarão muitas das perguntas acima. Ao mesmo tempo, observando as mídias sociais, posso te afirmar que os erros advindos de influenciadores digitais e “gurus fitness” (digo: uma grande parcela não graduado em nutrição), são ainda mais gritantes, gigantescos, apavorantes.

Beleza, vou te ajudar nas respostas:

Batata inglesa, batata-doce, arroz branco e arroz integral são, todos, carboidratos complexos, pois são polissacarídeos (amido). Isso mesmo, batata inglesa e arroz branco não são carboidratos simples. Sabia disso?

Os carboidratos simples incluem os monossacarídeos (glicose, frutose e galactose) e oligossacarídeos (onde se destacam os dissacarídeos: maltose, lactose e sacarose). Essa é uma classificação química dos carboidratos, ou seja, facilmente observada em qualquer livro de química e bioquímica. Portanto, a sacarose (“açúcar refinado”) é formada por glicose e frutose, sendo um dissacarídeo.

Eu sei, você está confuso(a). As pessoas frequentemente confundem uma classificação puramente química (monossacarídeos, oligossacarídeos e polissacarídeos) com uma classificação de importância clínica e nutricional, como o índice glicêmico (IG). O IG classifica um alimento de acordo com sua resposta glicêmica pós-prandial (após ingestão) e, consequentemente, resulta em picos do hormônio insulina (índice insulinêmico).

Neste sentido, a maçã e a melancia são carboidratos simples (quimicamente falando), mas maçã possui baixo índice glicêmico (IG=36), enquanto que melancia possui alto índice glicêmico (IG=72). Vejam que curioso: arroz branco e batata-doce são carboidratos complexos (quimicamente falando), mas arroz branco tem moderado índice glicêmico (IG=69), enquanto que batata-doce possui baixo índice glicêmico (IG=54). Conseguem perceber a tremenda confusão que as pessoas fazem nas postagens sensacionalistas e midiáticas para ganhar curtidas e seguidores?

Em outras palavras, os carboidratos não são todos iguais e nem todo carboidrato é um açúcar (sacarose). E, claro, todo carboidrato será transformado em monossacarídeo pelo processo digestivo, particularmente em glicose.

Deixa-me finalizar, dizendo: um conceito mais interessante, na minha opinião, é a carga glicêmica (CG). A carga glicêmica (CG) quantifica um alimento de acordo com seu conteúdo de carboidrato disponível. Por exemplo, a melancia é um carboidrato simples, de elevado índice glicêmico, porém não possui grande efeito sobre a insulinemia, pois sua CG é baixa (apenas 6g de carboidrato em 120g da fruta). Isso é muito diferente de comer uma pequena barra de cereal (cerca de 15 g de carboidrato em apenas 20g de produto). Será que entendeu? Creio que sim. Agora, volte as 10 perguntas acima e tente responder.  

 

Realizado o devido esclarecimento, continuamos.

 

SEGUNDA REFLEXÃO:

As mídias sociais deram voz as pessoas, pois temos liberdade de expressão. Todavia, as pessoas se sentem à vontade para opinar sobre todo e qualquer assunto, mesmo aqueles que possuem pouca ou nenhuma competência técnico-científica: nutrição e alimentação, treinamento, medicamentos, estética e cosmética, paleontologia, arqueologia, astros e planetas, mas também política, religião, futebol (...).

Até aí não deveria existir problemas, pois quem iria acreditar em um mecânico falando de uma cirurgia cardíaca, não é mesmo? Ou, quem iria acreditar em um arquiteto dando dicas para uma troca de canal do dente danificado? Eu, por exemplo, sou totalmente ignorante quantos aos astros, planetas, astrofísica. Sendo assim, você deveria dar créditos aos físicos e astrofísicos para obter informações mais adequadas e fidedignas, não é mesmo? Todavia, porque sobre nutrição e alimentação não ocorre a mesma coisa? Por que pessoas não graduadas em nutrição dão “pitacos” em assunto que desconhecem e, pior ainda, você dá ouvidos? Por que você segue os conselhos de um coach de emagrecimento ao invés de escutar um profissional nutricionista? 

AHHH, mas esses influenciadores, mesmo não graduados em nutrição, seguem um estilo de vida e de alimentação saudáveis. OK, minha avó viveu até 90 anos, então vou acreditar nos conselhos dela sobre alimentação e nutrientes, afinal viveu até 90 anos? Aliás, minha avó também acredita que cerveja Malzbier é bom para as grávidas produzirem leite, bem como gota de querosene com mel curaria a bronquite. O que me diz disso?

AHHH, mas esses influenciadores, mesmo não graduados em nutrição, exibem corpos musculosos, definidos, impressionantes. OK, as pessoas facilmente confundem APARÊNCIA com COMPETÊNCIA. Entendo que parece mais “fácil” acreditar nas palavras do The Rock (apenas uma brincadeira com o ator Dwayne Douglas Johnson para ilustrar alguém grande e musculoso) do que no ator Brendan Fraser interpretando um obeso no filme “The Whale” (A Baleia) (apenas outra brincadeira para ilustrar um indivíduo com obesidade). Todavia, quem disse que todos os profissionais de nutrição são obesos? Quem disse que aparência atlética é sinônimo de conhecimento ou inteligência acima da média? Aliás, um profissional nutricionista com sobrepeso ou obesidade perderia sua capacidade intelectual e competência profissional? Aliás, se um cardiologista pode ter um infarto; um oncologista pode ter câncer; um dentista pode ter um siso inflamado; um hepatologista pode ter uma doença do fígado; porque um nutricionista não poderia estar acima do peso?

Este é um assunto para outra postagem, mas deixo a breve reflexão aqui.

É neste ponto que convido todos vocês à terceira reflexão, que busca finalmente responder nossa pergunta:

O AÇÚCAR PODE VICIAR?

 

TERCEIRA REFLEXÃO:

As mídias sociais e meios de comunicação de massa, muitas vezes movimentado de pessoas de “boa oratória e aparência atlética” (já falamos disso) vão dizer que açúcar é viciante. Quando questionados, dizem: o açúcar vicia porque aumenta os níveis de dopamina no cérebro.

Beleza, vamos pensar nisso:

Parece lógico pensa assim, afinal dopamina é um neurotransmissor relacionado à motivação e sistema de recompensa no cérebro. Segundo defensores, o açúcar, após sua ingestão, causa uma sensação de prazer, bem-estar, semelhante as drogas (cocaína, crack, cigarro). E complementam: quando os níveis de dopamina caem, queremos novamente essa sensação e vamos atrás de mais açúcar. O açúcar, segundo “experts” em mídias sociais, causa vício e um “ciclo vicioso” de consumo, sensação de alívio e bem-estar, seguido de queda do prazer e nova procura viciante.  

Pois bem, agora vamos falar sério? Para tanto, alguns FATOS precisam ser abordados:

 

FATO N.1:

A opinião de um especialista (mesmo graduado em áreas da saúde) é importante, porém tem pouco (ou nenhum) grau de evidência em nosso debate. Não quero ser chato (mas já sendo), os debates precisam de comprovações, evidências, para confirmar uma hipótese. Ao mesmo tempo, a opinião pessoal de um coach de emagrecimento, guru fitness ou qualquer influenciador digital não graduado em ciências biológicas ou da saúde tem ZERO impacto em nossa discussão.

 

FATO N.2:

Alguns estudos científicos sobre o vício do açúcar são fracos, frágeis e, até mesmo, mal-intencionados. Outros, por sua vez, envolvem animais de experimentação (camundongos, ratos, coelhos, etc.), em ambientes controlados, com uma ou mais combinações de drogas e suplementos, não podendo ser extrapolados para seres humanos. Da mesma forma, estudos in vitro não podem ser extrapolados para seres humanos, pois uma célula está fora de seu contexto biológico e fisiológico, resumindo didaticamente dessa forma.

 

FATO N.3:

Observar um aumento nos níveis de dopamina, após consumo de açúcar, não significa “vício” do açúcar como alguns argumentam. Deixa-me te explicar: você também aumenta os níveis de dopamina ouvindo música, cantando, dançando e posso dizer que sou viciado em música ou dança? Quer dizer, se você me tirar a música do METALLICA (que estou escutando agora mesmo) terei uma síndrome de abstinência? Ou melhor, sou tão viciado em METALLICA que estou procurando aumentar a “dose” desta música a cada dia? Diga-me: já ouviu falar de alguém roubando e matando para manter o “vício” em escutar as músicas do METALLICA? Percebem como é ridículo falar que “açúcar vicia” porque aumenta dopamina?

Deixa-me explorar um pouco mais esse assunto.

Para dizer que algo é viciante como drogas, precisamos estabelecer critérios diagnósticos para vício, não concordam? O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DMS-5) traz alguns critérios para dependência química:

1. Tolerância (necessidade de aumentar a dose);

2. Síndrome de abstinência;

3. Uso compulsivo da substância;

4. Perda de controle;

5. Impacto negativo na vida diária.

 

A Classificação Internacional de Doenças (CID-10) também traz os critérios de dependência de substâncias:

1. Desejo forte e compulsivo de consumir a substância;

2. Dificuldades para controlar o comportamento de consumo de substâncias em termos de início, fim ou níveis de consumo;

3. Estado de abstinência fisiológica, quando o consumo é suspenso ou reduzido, evidenciado por síndrome de abstinência característica ou consumo da mesma substância (ou outra muito semelhante) com a intenção de aliviar ou evitar sintomas de abstinência;

4. Evidência de tolerância, ou seja, necessidade de doses crescentes da substância psicoativa para a obtenção dos efeitos anteriormente produzidos com doses inferiores;

5. Abandono progressivo de outros prazeres ou interesses em virtude do consumo de substâncias psicoativas, aumento do tempo empregado na aquisição ou consumo da substância ou na recuperação de seus efeitos;

6. Persistência no consumo das substâncias apesar de provas evidentes de consequências manifestamente prejudiciais, tais como lesões hepáticas causadas por consumo excessivo de álcool, humor deprimido consequente a um grande consumo de substâncias, ou perturbação das funções cognitivas relacionada com a substância.

 

Enfim, você consegue imaginar alguém roubando os pertencentes dos pais para comprar desesperadamente açúcar? Você imagina alguém consumindo excessivamente açúcar mascavo para substituir o “vício” do açúcar refinado? Você conhece pessoas com síndrome de abstinência advindo do “vício do açúcar” ou apenas relatos breves e temporários de cefaleia e cansaço pela redução do aporte calórico em dietas de emagrecimento? Você conhece “viciados em açúcar” que largaram o emprego e a família para viver no submundo, vagando pelas ruas? Por acaso, conhece pessoas com perturbações cognitivas e psíquicas em decorrência do “vício do açúcar”?

Vejam, não estou saindo em defesa do açúcar refinado, mas fazendo você perceber como algumas notícias em mídias sociais e meios de comunicação de massa são superficiais e, por vezes, errôneos.

Peraí, não acabei.

 

FATO N.4:

O sistema límbico é acionado por “emoção” e “recompensa” para produzir uma “ação”. Neste sentido, o núcleo accumbens (NAc) possui um papel de destaque, pois é o eixo central do sistema límbico e atua na interface conectando o sistema límbico e o motor. O NAc recebe projeções glutamatérgicas advindo de diferentes áreas: núcleo basolateral da amígdala (BLA), córtex pré-frontal medial (mPFC) e área do hipocampo ventral (vHPC). Com base em informações emocionais, cognitivas e experienciais, o NAc (recebendo sinais de diferentes áreas cerebrais) determina a direção da ação e informa ao pálido ventral (VP). Em seguida, o VP envia sinais ao núcleo habenular lateral (LHb) ou diretamente à área tegmentar central (VTA), que faz um julgamento e modifica a ação através do sistema de recompensa. Os neurônios VTA se projetam ao NAc via dopamina (DA), que é um neurotransmissor relacionado à motivação e sistema de recompensa no cérebro.

Com base nisso, quando falamos em alimentação, incluindo o consumo de açúcar, parece plausível observar aumento nos níveis de dopamina (DA). Em outras palavras, parece óbvio que a alimentação, com ou sem açúcar, produz uma sensação de prazer, bem-estar, alívio de estar alimentado, pois o sistema de recompensa (dopaminérgico via VTA) está envolvido. Porém, você também aumenta DA ouvindo música, cantando e dançando, como já foi dito. Aliás, o exercício físico ativa o sistema límbico via núcleo tegmentar dorsolateral (LDT) no tronco cerebral, que acaba excitando VTA e DA. Ao mesmo tempo, DA é tradicionalmente envolvido com o sistema de recompensa, mas sua liberação também ocorre em resposta aos eventos aversivos, como estresse e dor.

O que estou querendo dizer? Simples: aumentar dopamina no cérebro não é algo exclusivo do consumo de açúcar e, portanto, este argumento que açúcar vicia porque aumenta dopamina é frágil (para não dizer errado). 

Aliás, vamos falar opioides se é para falar de vício.

Opioides (palavra derivado do ópio) são medicamentos do tipo analgésicos (morfina, codeína, oxicodona) e usado, muitas vezes, para aliviar a dor e sofrimento dos pacientes. Existem receptores de opioides no sistema nervoso central (SNC), onde seu uso nada racional gera preocupação de vício. Isso mesmo, os opioides podem levar ao vício. Neste sentido, você encontrará relatos de dependência química (habituação), tolerância (aumento da dose para obter o mesmo efeito) e síndrome de abstinência. Os pacientes viciados em opioides são tratados por médicos psiquiatras, pois o vício de opioides é considerado um transtorno psiquiátrico. Por isso, deve-se conscientizar as pessoas do perigo de usar opioides sem prescrição médica.

Não quero apresentar uma discussão aprofundada do mecanismo de ação dos opioides, mas se açúcar é viciante como drogas, porque não discutem as vias bioquímicas dos opioides ao invés da dopamina? Quer dizer, porque não discutem os receptores delta, kappa e Mu após consumo de açúcar? Os receptores Mu, por exemplo, poderia explicar a sensação de euforia, prazer, bem-estar, dependência, mas aí teríamos que discutir analgesia, redução da motilidade gastrintestinal e depressão respiratória. Claro, você não encontrará estudos neste sentido e, dessa forma, pergunto: como o açúcar pode viciar?

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Assim como o açúcar, observo o mesmo discurso para alimentos processados e ultraprocessados atualmente. Ninguém seria maluco de defender o consumo do açúcar e alimentos industrializados quando pensamos em saúde, mas alegações de vício me parecem frágeis, incoerentes e definitivamente pobres em argumentação. Frequentemente usamos o termo “Sou viciado em esportes” ou “Sou viciado em estudar”, mas percebe que se trata de uma figura de linguagem para causar impacto no ouvinte ou leitor? Sendo assim, use a frase “Sou viciado em açúcar” para justificar sua falta de dedicação com o plano alimentar prescrito pelo profissional nutricionista devidamente capacitado, mas lembre-se: não é essencialmente um vício, pois você não apresentará sudorese excessiva, dores de cabeça intermináveis, sensação de inquietação motora e tremores, nistagmo (movimento involuntário dos olhos), insônia, alteração na frequência cardíaca e respiratória, tontura, náuseas, vômitos, pupilas dilatadas, calafrios, boca seca e depressão se eu retirar o açúcar refinado (sacarose) de sua dieta. 

sexta-feira, 14 de junho de 2024

FENO-GREGO AUMENTA OS NÍVEIS DE TESTOSTERONA?

 

FENO-GREGO AUMENTA OS NÍVEIS DE TESTOSTERONA?

 

JOELSO PERALTA, Nutricionista, Professor, Palestrante, Mestre em Medicina: Ciências Médicas e PhD Student in Biological Sciences: Pharmacology and Therapeutics, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)




Acho bastante curioso o discurso pseudocientífico (e midiático) em redes sociais, especialmente advindo de profissionais de saúde, para “vender” serviços e produtos sem qualquer comprovação científica. Não quero entrar no mérito dos motivos (obscuros, talvez) de tais propagandas, mas recentemente observei um discurso que o feno-grego, uma espécie vegetal dita “planta medicinal”, teria “eficácia comprovada” para aumentar os níveis de testosterona em homens e, consequentemnte, aumentar a força e massa muscular. Eficácia comprovada? Onde? Qual estudo se baseou essa oratória? Qual o nível de evidência? Sou Prof. Joelso Peralta e gostaria de trazer alguns estudos a respeito do feno-grego.

 

Feno-grego ou Trigonella foenum-graecum é uma espécie vegetal que, segundo informações atreladas às mídias sociais, possui propriedades anti-inflamatórias, antioxidantes e antidiabéticas. Em outra ocasião podemos discutir tais alegações, mas no momento que esclarecer a alegação do feno-grego em aumentar os níveis séricos de testosterona em homens, o que resultaria em hipertrofia muscular e aumento da força. Os “experts em mídias sociais” ou Digital Influencers não descrevem os mecanismos pelos quais o feno-grego aumentaria os níveis de testosterona, mas afirmam com toda convicção que funciona ou que possui “eficácia comprovada”. Será mesmo? Separei 3 estudos para conversarmos.

 

Estudo 1: Testofen, a specialised Trigonella foenum-graecum seed extract reduces age-related symptoms of androgen decrease, increases testosterone levels and improves sexual function in healthy aging males in a double-blind randomised clinical study. Randomized Controlled Trial. Aging Male 2016;19(2):134-42 (doi: 10.3109/13685538.2015.1135323).

Segundo ensaio clínico randomizado, controlado por placebo (portanto, elevado grau de evidência científica), publicado em 2016, o feno-grego (T. foenum-graecum), na dosagem de 600 mg/dia, por 12 semanas, melhorou a função sexual (número de ereções matinais e frequência de atividade sexual), bem como aumentou as concentrações séricas de testosterona total e livre quando comparado ao placebo. Um questionário de sintomas do envelhecimento humano (AMS Questionnaire: Aging Male Symptom Scale) também foi utilizado, mostrando melhoras nos escores. Neste estudo, foram avaliados 120 homens saudáveis adultos (43 a 75 anos), mas somente 111 completaram o estudo. Estes foram distribuídos em 2 grupos: ativo, ou seja, uso do feno-grego (n=56); e placebo (grupo controle, n=55).

Beleza, gostou? Peraí, vamos olhar os resultados com mais atenção?

Não há diferença estatística significativa entre ativo (feno-grego) e placebo, respectivamente, para os seguintes parâmetros avaliados no estudo: testosterona total (12,3 e 13,2 nmol/L), testosterona livre (241 e 254 pmol/L), SHBG (34,5 e 36,6 nmol/L), DHEAS (3,6 e 3,9 umol/L) e androstenediona (5,6 e 5,6 nmol/L). Também não houve diferença significativa para o perfil lipídico (TG, LDL, HDL, CT e relação HDL/LDL). Não foram avaliados hipertrofia muscular, tão pouco a força dos voluntários. Em outras palavras, não se pode afirmar que feno-grego melhorou o perfil hormonal (e lipídico) no grupo estudado ao ponto de promover a hipertrofia muscular ou força.

A correlação estatística da testosterona com as demais variáveis (idade, perfil lipídico, sono, função sexual e atividade física) também não ocorreu. Quer dizer, não houve mudanças no padrão do sono ou quanto ao nível de atividade física entre os grupos.

Aparentemente, observa-se melhoria na escala de sintomas do envelhecimento humano, mas a análise estatística não encontrou alterações na função e comportamento sexual, nem mesmo no número de orgasmos. Aliás, o AMS Questionnaire é um questionário auto respondido, contendo 17 questões e, portanto, o desejo sexual e número de ereções matinais auto relatada se torna bastante subjetiva.

Creio que os autores valorizam “um pouquinho” sua conclusão.

Leia o estudo inteiro!

Vejamos outro estudo:

 

Estudo 2: Effect of fenugreek extract supplement on testosterone levels in male: A meta-analysis of clinical trials. Phytother Res 2020;34(7):1550-1555 (doi: 10.1002/ptr.6627).

Aqui temos uma meta-análise de ensaios clínicos, portanto, outro estudo de elevada evidência científica. Foram selecionados 29 estudos em diferentes bancos de dados (Medline, PubMed, Scopus, Cochrane Library, Web of Science e Google Scholar), onde 4 são ensaios clínicos randomizados. Vamos verificar estes 4 estudos, afinal possuem maior grau de evidência. As dosagens de feno-grego oscilaram de 250 a 600 mg/dia, por 8 a 12 semanas. Foram identificados, portanto, um total de 206 participantes. Segundo autores, citando outros estudos, o feno-grego melhora os níveis de testosterona e também possuem atividades anabólicas e androgênicas.

Peraí, quais foram os resultados deste estudo?

Se você observar o gráfico Forest Plot (gráfico de floresta), que compara a intervenção A (feno-grego) com B (controle), poderá observar que quem ganhou foi o controle. Em outras palavras, não existe evidência científica para afirmar qualquer benefício do feno-grego sobre os níveis hormonais de testosterona em homens. Estes autores concluem dizendo: a eficácia do extrato de feno-grego sobre os níveis de testosterona total necessita de estudos complementares.

Portanto, parece óbvio que não eficácia comprovada.

Contudo, os DESinfluenciadores digitais não desistem, sendo que alguns deles são médicos, o que torna mais divertida nossa discussão.

Não existem muitos estudos sobre feno-grego, então estou selecionando aqueles com maior grau de evidência para discutir com vocês. Quer dizer, alguns estudos possuem metodologia duvidosa ou foram realizados in vitro ou com roedores e, portanto, não cabem em nossa discussão mais criteriosa para achar uma “eficácia comprovada” em seres humanos.

Vejamos, finalmente, outro estudo:

 

Estudo 3: Efficacy and Safety of a Mixed Extract of Trigonella foenum-graecum Seed and Lespedeza cuneata in the Treatment of Testosterone Deficiency Syndrome: A Randomized, Double-Blind, Placebo-Controlled Clinical Trial. World J Mens Health 2018;36(3):230-238 (doi: 10.5534/wjmh.170004).

Este é um ensaio clínico randomizado, duplo-cego, controlado por placebo, que buscou investigar a eficácia do feno-grego na síndrome de deficiência de testosterona. Foram selecionados 88 homens coreanos. Além do feno-grego (Trigonella foenum-graecum), este estudo também utilizou Lespedeza cuneata. Neste sentido, a sigla TFGL refere-se a mistura das duas plantas administradas em uma única cápsula. Os pacientes recebiam cápsulas de TFGL de 200 mg (substâncias juntas) ou placebo, 2 vezes ao dia (portanto, 400 mg/dia), por 8 semanas. Vamos direto aos resultados: o grupo suplementado exibiu melhora significativa nos escores AMS Questionnaire (já falamos dele), bem como aumento de testosterona total e livre em 4 e 8 semanas. Também relatam uma melhora significativa nos escores de colesterol total, HDL-C, LDL-C e triglicerídeos.

Interessante, não é mesmo? Claro, mas vamos aos detalhes:

O nível de testosterona sérica total passou de 4,3 para 4,9 ng/mL (430 para 490 ng/dL) ao final de 8 semanas no grupo tratado (TFGL), o que representa uma diferença de apenas 0,6 ng/mL (60 ng/dL). Esse achado foi considerado estatisticamente significativo (p<0,001).

Já no grupo placebo, a testosterona total passou de 4,4 para 3,9 ng/mL (440 para 390 ng/dL), ou seja, uma redução de apenas 0,5 ng/mL (50 ng/dL), o que foi estatisticamente significativo (p<0,001).

O nível de testosterona livre passou de 7,7 para 8,8 pg/mL ao final de 8 semanas no grupo tratado (TFGL), que representa uma diferença de 1,1 pg/mL (p<0,001).

No grupo placebo, a testosterona livre passou de 7,7 para 6,9 pg/mL, que representa uma diferença de 0,8 pg/mL (p<0,001).   

Interessante, você não acha? Contudo, faço as seguintes perguntas:

Embora significativo do ponto de vista estatístico, qual a relevância clínica (ou esportiva) nessa discreta diferença, em 8 semanas, para testosterona total (aumentou em 60 ng/dL) e testosterona livre (aumentou em 1,1 pg/mL) no grupo tratado? Peraí, vamos relembrar os níveis normais de testosterona em homens:

Testosterona total: 300 a 1000 ng/dL (adultos)

(Quer dizer, aumento de 60 ng/dL lhe parece muito expressivo?)

Testosterona livre: 18 a 40 pg/mL (adultos)

(Quer dizer, aumento de 1,1 pg/mL lhe parece muito expressivo, considerando que os valores já estavam abaixo do referencial?)

Observem que o nível de testosterona total e livre no baseline (dados basais) era o mesmo em ambos os grupos: tratado e placebo (4,3 e 4,4 ng/dL e 7,7 e 7,7 pg/dL, respectivamente). Portanto, porque em apenas 8 semanas o nível de testosterona total e livre diminuiu? Quer dizer que placebo reduz testosterona (rsrs)?

Ainda, será que os resultados seriam diferentes se os indivíduos fossem submetidos ao treinamento de força concomitante? Além disso, os resultados seriam diferentes (melhores ou piores) se houvesse acompanhamento dietético, por exemplo, dieta rica em proteínas de alto valor biológico associado ao treino de força?

Será que os resultados seriam diferentes se a amostra não fosse composta com apenas por indivíduos coreanos? Quer dizer, como seriam os resultados em outras etnias? Aliás, a idade média no grupo tratado foi de 59,2 anos e no grupo placebo de 57 anos. Portanto, os resultados seriam diferentes em adultos jovens (30 a 45 anos, por exemplo)?

Enfim, não podemos afirmar que feno-grego tem “eficácia comprovada” para aumentar os níveis de testosterona e, como isso, resultar em aumento da hipertrofia e da força. Nota-se, claramente, que não podemos extrapolar os resultados deste estudo (e tantos outros) para toda população que faça uso do feno-grego.

Peraí, não acabei:

O AMS Questionnaire é bastante subjetivo e já falamos disso anteriormente. Contudo, sem problemas, pois faz parte das limitações que todos os estudos possuem. Contudo, a composição corporal dos indivíduos não se alterou (massa muscular e massa de gordura) ao final do estudo (e não há diferença estatística significativa). De acordo com os autores, a inexistência de mudanças na composição corporal deve-se ao pequeno período do estudo. AHHH TAH, se fosse 12 semanas teríamos resultado mais expressivo?

Além disso, foi administrado as duas plantas ao mesmo tempo (Trigonella foenum-graecum e Lespedeza cuneata, portanto, TFGL) em cápsulas de 200 mg/dia (2 vezes ao dia). Dessa forma, qual espécie vegetal realmente foi responsável pelos resultados (que não me parecem nada surpreendentes)? Veja, L. cuneata pode sequestrar radicais livres, deixando o ambiente antioxidante mais favorável. A espécie L. cuneata também pode ter efeito vasodilatador, mediado por GMPc-NO (guanosina monofosfato cíclico e óxido nítrico), que poderia tratar uma disfunção erétil (dando escore positivos nos questionários avaliativos). Sendo assim, T. foenum-graecum (feno-grego) ou L. cuneata foram responsáveis pelos resultados avaliativos?

 

Por fim, nenhum mecanismo de ação foi estudado (avaliado, mensurado) nos estudos acima para afirmar que testosterona aumenta a força e a massa muscular via eixo hipotálamo-hipófise-gonadal, envolvendo LH (hormônio luteinizante) e FSH (hormônio folículo estimulante). Portanto, qualquer argumentação neste sentido é, no mínimo, leviana, mentirosa ou mal-intencionada. Repito minha introdução: acho bastante curioso o discurso pseudocientífico (e midiático) em redes sociais para “vender” serviços e produtos sem qualquer comprovação científica.

terça-feira, 11 de junho de 2024

IOIMBINA EMAGRECE?

 

IOIMBINA EMAGRECE?

 

JOELSO PERALTA, Nutricionista, Professor, Palestrante, Mestre em Medicina: Ciências Médicas e PhD Student in Biological Sciences: Pharmacology and Therapeutics, UFRGS.




Olá pessoal, tudo bem?

Certamente você já ouviu falar do suplemento esportivo conhecido como IOIMBINA (YOHIMBINE), não é mesmo? E, talvez, até pensou em usá-lo sob alegação que ajudaria no processo de emagrecimento, acertei? Parece bastante lógico, afinal em uma busca rápida pela internet poderá encontrar as seguintes informações:

“Não é de hoje que a capacidade da ioimbina para ajudar no controle do peso vem sendo avaliada e por esse motivo está presente em alguns suplementos emagrecedores. Ioimbina pode ter efeito estimulante no corpo, semelhante à cafeína”. [1]

“A literatura não é clara quando se fala em benefícios da ioimbina no emagrecimento, mas acredita-se que pode ter efeito termogênico leve, como também pode reduzir o apetite”. [2]

“Após ingerida, a ioimbina propicia a elevação da excitabilidade da célula, de forma de que ao consumir este fármaco, a célula intensifica o gasto de energia. Ao favorecer esse gasto energético mais elevado, consequentemente age na perda de peso, sobretudo na queima de gordura localizada”. [3]

“A ioimbina é usada na musculação como queimador de gordura, é uma das poucas ferramentas que queimam gordura localizada em locais problemáticos, como o abdômen”. [4]

 

Pois então, isso é o que você lê por aí, em sites, blogs e redes sociais, absolutamente sem cunho científico, mas, por vezes, bastante convincente. Porém, podemos falar seriamente agora? Ou melhor, posso lhe apresentar informações baseadas em ciência sobre a Ioimbina no emagrecimento? Se sim, vamos lá.

 

Se você procurar ioimbina (yohimbine) no PubMed (entre 1989 a 2024) encontrará 24.921 resultados (não pense que é muito, pois se colocar a palavra câncer encontrará 5.116.965 estudos). Se refinar sua pesquisa um pouco mais usando os descritores “yohimbine and body weight loss” (ioimbina e perda de peso corporal) encontrará apenas 46 resultados. Agora, vamos colocar um filtro de 5 anos (2019-2024, afinal 35 anos é uma janela muito grande de pesquisa), onde encontrará apenas 2 resultados. Isso mesmo: apenas 2 estudos! Peraí, vamos procurar aqueles de maior evidência científica (ou seja, meta-análises, revisões sistemáticas e ensaios clínicos randomizados). Perfeito, sua busca foi “NENHUM RESULTADO ENCONTRADO”. Exatamente: não existem estudos que comprovem benefícios/eficácia e segurança do uso de ioimbina no exercício e no esporte quando pensamos em emagrecimento. Em outras palavras, as pessoas usam substâncias sem evidências científicas para uma finalidade proposta e, pior, acreditam que a substância funciona lendo na “internet” ou obtendo opiniões de amigos do Universos Fitness.

 

BELEZA, não serei tão chato (rs)!

Lembra dos 46 resultados que achamos?

Deixa-me falar dos mais relevantes:

 

Um estudo publicado em 1991 (antigo ‘pra cacildis’), mostrou que 5 mg de ioimbina, 4 vezes ao dia, por 3 semanas, resultou em perda de peso (3,5 kg) versus placebo (2,2 kg) (UAU, baita diferença para 3 semanas, não é mesmo?). Todavia, os 25 indivíduos obesos que participaram do estudo recebiam, além da ioimbina, uma dieta hipocalórica (1000 kcal/dia). Quer dizer, entendeu ou preciso desenhar? [5]

 

Keep Calm (mantenha a calma), vamos para 2009, onde um estudo [6] mostrou que o uso de ioimbina (5 mg) em um fisiculturista de 37 anos resultou em efeitos neurotóxicos agudos e graves. Claro, culturistas usam muitas drogas associadas (polifarma), então temos um viés aqui.

 

Continuemos...

 

OK, vamos limitar a busca para 10 anos, onde temos 4 estudos:

 

Estudo publicado em 2016 [7], revisando a fitoterapia na obesidade, concluiu que será necessário estudar mais as ervas nativas, incluindo ioimbina, para determinar sua eficácia e segurança quando os objetivos envolvem a perda de peso. Traduzindo: não há evidência!

 

Continuemos...

 

No próximo estudo, publicado em 2016 [8], os autores abordaram o sistema endocanabinóide (papel de neurotransmissores endógenos que regulam funções como humor, apetite, sono, memória, dor e resposta imune, cujo receptores estão predominantemente no cérebro). Não é um estudo específico sobre ioimbina, mas a busca jogou neste porquê algumas plantas (por exemplo, gênero Cannabis) podem influenciar o sistema endocanabinóide. Além disso, o estudo é com raros (não seres humanos) e buscava investigar ansiedade e depressão e não emagrecimento. Traduzindo: não há evidência!

 

Continuemos...

 

O terceiro desta busca [9] foi publicado em 2020 e buscou estudar disfunção mitocondrial em modelo experimental (roedores) de fibromialgia induzida por reserpina. Não tem relação com ioimbina, mas a busca jogou nele porquê reserpina é um alcalóide proveniente da Rauwolfia serpentina, da família Apocynaceae, nativo da Índia, sendo uma substância que atua no sistema nervoso simpático. A ioimbina também é um alcalóide, porém encontrada na espécie Pausinystalia yohimbe e Rauwolfia serpentina, por isso a confusão na busca. Quer dizer, a inexistência de estudos atuais sobre a ioimbina é tão grande que a própria busca gera confusão, mas tanta achar algo semelhante, similar, parecido para agradar à busca. Traduzindo: não há evidência!

 

Continuemos...

 

Por fim, o último estudo desta busca [10] foi publicado em 2023, portanto, bem atual. Segundo estudo, foram avaliados 91 suplementos alimentares destinados a perda de peso, os quais poderiam ter substâncias declaradas (ou não) com potencial risco à saúde. Neste sentido, aminas biológicas e alcalóides naturais são avaliados, incluindo ioimbina. O estudo encontrou fraudes na rotulagem de suplementos alimentares à base de plantas (26% das amostras não estavam em conformidade). Contudo, tem um trecho interessante: “Suplementos contendo ioimbina são proibidos no Canadá, Austrália, Holanda e Reino Unido, devido relatos de efeitos adversos à saúde”. Traduzindo: não há evidência!

 

Continuemos...

 

E aí, percebeu a diferença entre “ler reportagens aleatórias e não científicas” e LER, ESTUDAR, ENTENDER, COMPREENDER, ACEITAR o que diz a literatura científica a respeito da ioimbina no emagrecimento?

 

Peraí, não tô 100% satisfeito, então segura mais um embasamento científico:

 

Uma revisão sistemática (1043 estudos identificados, onde 18 mais relevantes foram selecionados) publicada em 2023 [11], avaliou o efeito de suplementos alimentares (inclusive ioimbina) sobre o desempenho atlético em jogadores de futebol. Quer saber o resultado da ioimbina? Segura: os dados disponíveis não suportam o uso de ioimbina para melhorar o desempenho atlético em jogadores de futebol. Traduzindo: não há evidência!

 

Continuemos...

 

Puxa, sacanagem você pensa alto:

“Eu acreditei que funcionava, comprei e usei”.

 

Pois meu amigo ou minha amiga, porque não consultou um profissional nutricionista altamente capacitado para lhe ajudar com a dieta e uso racional de suplementos esportivos?

 

Peraí, tenho mais algumas coisas para te contar.

 

Um relatório sobre os suplementos alimentares utilizados no esporte, publicado em 2022 [12] avaliou 17 produtos. Neste relatório ioimbina nem apareceu na discussão, devido inexistência de estudos ou de bons estudos para discussão. Traduzindo: não há evidência!

 

Continuemos...

 

E o que diz o Colégio Americano de Medicina do Esporte (ACSM, American College of Sports Medicine [13]? No capítulo sobre suplementos alimentares e auxílios ergogênicos, os mesmos foram classificados em 4 grupos: auxílios ergogênicos que funcionam (creatina, cafeína, bebidas esportivas, bicarbonato de sódio, suplementos proteicos e alguns aminoácidos); auxílios ergogênicos que podem funcionar, mas faltam evidências (glutamina, HMB, colostro e ribose); auxílios ergogênicos que não funcionam (alguns aminoácidos isolados, pólen de abelha, BCAA, carnitina, picolinato de cromo, coenzima Q10, ácido linoleico conjugado, Ginseng, inosina, TCM e vanádio); e auxílios ergogênicos perigosos, proibidos e ilegais (suplementos que contenham esteroides anabólicos e derivados esteroides ou GH, Tribulus terrestris e Ephedra). Ou seja, Ioimbina nem entra na discussão pela inexistência de estudos que comprovem seu uso, eficácia e segurança. Traduzindo: não há evidência!

 

Continuemos...

 

E a Sociedade Internacional de Nutrição Esportiva (INSS, International Society of Sports Nutrition) [14], diz o quê? Entre suas inúmeras publicações relacionadas ao binômio nutrição e exercício, encontramos uma revisão da fitoterapia no esporte, incluindo a suplementação de alcalóides. Ioimbina  só aparece ao final do texto em uma sessão dita “ervas comercializadas com pesquisa limitada”. Em outras palavras, não existem evidências científicas para indicar o consumo de ioimbina, ou seja, não há comprovação científica de eficácia e segurança. Sendo repetitivo: não há evidência!

 

Continuemos...

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS:

Em suma, as alegações fantasiosas e mirabolantes (emagrecedor, queimador de gordura, acelerador metabólico, termogênico, supressor do apetite, perda de gordura localizada, entre outras) associadas à Ioimbina carecem totalmente de evidência científica e, mesmo assim, vem sendo comercializada, prescrita (inacreditável) e usada por muitos esportivas e atletas, bem como população não atleta que busca emagrecimento. Existem, obviamente, outras alegações para a utilização desse alcalóide (por exemplo, como estimulante sexual), mas também existem efeitos colaterais que estão sendo ignorados pelos usuários (por exemplo, aumento da pressão arterial e desordens psíquicas). Espero, sinceramente, que este post abra seus olhos e sua mente, pois crer em Digital Influenciers com milhares de seguidores, mas nenhuma capacitação e competência profissional é, no mínimo, muita inocência de sua parte!

 

 

REFERÊNCIAS:

1.  1) Ioimbina emagrece? Disponível em: treinomestre.com.br

2.  2) Ioimbina emagrece? Disponível em: www.terra.com.br

3.  3) Ioimbina. Disponível em: www.dicasdetreino.com.br

4.  4) Ioimbina. Disponível em: www.hipertrofia.org

5.  5) C Kucio, K Jonderko, D Piskorska. Isr J Med Sci 1991;27(10):550-6

6.  6) Andres Giampreti et al. Clin Toxicol 2009;47(8):827-9.

7.  7) Mahmound et al. J Evid Based Complementary Altern Med 2016;21(3):228-34.

8.  8) Aliou et al. Int Neuropsicofarmacol 2016;30;19(12):pyw068.

9.  9) Evelyne SB et al. Mol Neurobiol 2020;57(10):4202-4217.

10) Giovanna Esposito et al. J Food Prot 2023;86(10):100152.

1  11) Rodrigo Abreu et al. J Int Soc Sports Nutr 2023;20(1):2236060.

12) Roberto Cannataro, Natascia Straface, Erika Cione. Human Nutrition and Metabolism (Science Direct) 2022;29:200155.

13) Medicine & Science in Sports & Exercise 2009;41(3):709-731. American Dietetic Association (ADA), Dietitians of Canada (DC), and ACSM.

1  14) Maha S et al. J Int Soc Sports Nutrition 2018, 15:14.