IOIMBINA EMAGRECE?
JOELSO PERALTA, Nutricionista, Professor, Palestrante,
Mestre em Medicina: Ciências Médicas e PhD Student in Biological Sciences:
Pharmacology and Therapeutics, UFRGS.
Olá pessoal, tudo bem?
Certamente
você já ouviu falar do suplemento esportivo conhecido como IOIMBINA (YOHIMBINE),
não é mesmo? E, talvez, até pensou em usá-lo sob alegação que ajudaria no
processo de emagrecimento, acertei? Parece bastante lógico, afinal em uma busca
rápida pela internet poderá encontrar as seguintes informações:
“Não é de
hoje que a capacidade da ioimbina para ajudar no controle do peso vem sendo
avaliada e por esse motivo está presente em alguns suplementos emagrecedores.
Ioimbina pode ter efeito estimulante no corpo, semelhante à cafeína”. [1]
“A
literatura não é clara quando se fala em benefícios da ioimbina no
emagrecimento, mas acredita-se que pode ter efeito termogênico leve, como
também pode reduzir o apetite”. [2]
“Após
ingerida, a ioimbina propicia a elevação da excitabilidade da célula, de forma
de que ao consumir este fármaco, a célula intensifica o gasto de energia. Ao
favorecer esse gasto energético mais elevado, consequentemente age na perda de
peso, sobretudo na queima de gordura localizada”. [3]
“A
ioimbina é usada na musculação como queimador de gordura, é uma das poucas
ferramentas que queimam gordura localizada em locais problemáticos, como o
abdômen”. [4]
Pois
então, isso é o que você lê por aí, em sites, blogs e redes sociais, absolutamente
sem cunho científico, mas, por vezes, bastante convincente. Porém, podemos
falar seriamente agora? Ou melhor, posso lhe apresentar informações baseadas em
ciência sobre a Ioimbina no emagrecimento? Se sim, vamos lá.
Se você
procurar ioimbina (yohimbine) no PubMed (entre 1989 a 2024) encontrará 24.921
resultados (não pense que é muito, pois se colocar a palavra câncer encontrará
5.116.965 estudos). Se refinar sua pesquisa um pouco mais usando os descritores
“yohimbine and body weight loss” (ioimbina e perda de peso corporal) encontrará
apenas 46 resultados. Agora, vamos colocar um filtro de 5 anos (2019-2024,
afinal 35 anos é uma janela muito grande de pesquisa), onde encontrará apenas 2
resultados. Isso mesmo: apenas 2 estudos! Peraí, vamos procurar aqueles de
maior evidência científica (ou seja, meta-análises, revisões sistemáticas e
ensaios clínicos randomizados). Perfeito, sua busca foi “NENHUM RESULTADO
ENCONTRADO”. Exatamente: não existem estudos que comprovem benefícios/eficácia e
segurança do uso de ioimbina no exercício e no esporte quando pensamos em emagrecimento.
Em outras palavras, as pessoas usam substâncias sem evidências científicas para
uma finalidade proposta e, pior, acreditam que a substância funciona lendo na “internet”
ou obtendo opiniões de amigos do Universos Fitness.
BELEZA, não
serei tão chato (rs)!
Lembra
dos 46 resultados que achamos?
Deixa-me
falar dos mais relevantes:
Um estudo
publicado em 1991 (antigo ‘pra cacildis’), mostrou que 5 mg de ioimbina, 4
vezes ao dia, por 3 semanas, resultou em perda de peso (3,5 kg) versus placebo
(2,2 kg) (UAU, baita diferença para 3 semanas, não é mesmo?). Todavia, os 25
indivíduos obesos que participaram do estudo recebiam, além da ioimbina, uma
dieta hipocalórica (1000 kcal/dia). Quer dizer, entendeu ou preciso desenhar?
[5]
Keep Calm
(mantenha a calma), vamos para 2009, onde um estudo [6] mostrou que o uso de
ioimbina (5 mg) em um fisiculturista de 37 anos resultou em efeitos
neurotóxicos agudos e graves. Claro, culturistas usam muitas drogas associadas
(polifarma), então temos um viés aqui.
Continuemos...
OK, vamos
limitar a busca para 10 anos, onde temos 4 estudos:
Estudo
publicado em 2016 [7], revisando a fitoterapia na obesidade, concluiu que será
necessário estudar mais as ervas nativas, incluindo ioimbina, para determinar
sua eficácia e segurança quando os objetivos envolvem a perda de peso. Traduzindo:
não há evidência!
Continuemos...
No
próximo estudo, publicado em 2016 [8], os autores abordaram o sistema
endocanabinóide (papel de neurotransmissores endógenos que regulam funções como
humor, apetite, sono, memória, dor e resposta imune, cujo receptores estão
predominantemente no cérebro). Não é um estudo específico sobre ioimbina, mas a
busca jogou neste porquê algumas plantas (por exemplo, gênero Cannabis) podem
influenciar o sistema endocanabinóide. Além disso, o estudo é com raros (não
seres humanos) e buscava investigar ansiedade e depressão e não emagrecimento. Traduzindo:
não há evidência!
Continuemos...
O
terceiro desta busca [9] foi publicado em 2020 e buscou estudar disfunção
mitocondrial em modelo experimental (roedores) de fibromialgia induzida por
reserpina. Não tem relação com ioimbina, mas a busca jogou nele porquê
reserpina é um alcalóide proveniente da Rauwolfia
serpentina, da família Apocynaceae,
nativo da Índia, sendo uma substância que atua no sistema nervoso simpático. A
ioimbina também é um alcalóide, porém encontrada na espécie Pausinystalia yohimbe e Rauwolfia serpentina, por isso a confusão
na busca. Quer dizer, a inexistência de estudos atuais sobre a ioimbina é tão
grande que a própria busca gera confusão, mas tanta achar algo semelhante, similar,
parecido para agradar à busca. Traduzindo: não há evidência!
Continuemos...
Por fim,
o último estudo desta busca [10] foi publicado em 2023, portanto, bem atual.
Segundo estudo, foram avaliados 91 suplementos alimentares destinados a perda
de peso, os quais poderiam ter substâncias declaradas (ou não) com potencial
risco à saúde. Neste sentido, aminas biológicas e alcalóides naturais são
avaliados, incluindo ioimbina. O estudo encontrou fraudes na rotulagem de
suplementos alimentares à base de plantas (26% das amostras não estavam em
conformidade). Contudo, tem um trecho interessante: “Suplementos contendo
ioimbina são proibidos no Canadá, Austrália, Holanda e Reino Unido, devido
relatos de efeitos adversos à saúde”. Traduzindo: não há evidência!
Continuemos...
E aí,
percebeu a diferença entre “ler reportagens aleatórias e não científicas” e
LER, ESTUDAR, ENTENDER, COMPREENDER, ACEITAR o que diz a literatura científica a
respeito da ioimbina no emagrecimento?
Peraí,
não tô 100% satisfeito, então segura mais um embasamento científico:
Uma revisão
sistemática (1043 estudos identificados, onde 18 mais relevantes foram selecionados)
publicada em 2023 [11], avaliou o efeito de suplementos alimentares (inclusive
ioimbina) sobre o desempenho atlético em jogadores de futebol. Quer saber o
resultado da ioimbina? Segura: os dados disponíveis não suportam o uso de
ioimbina para melhorar o desempenho atlético em jogadores de futebol. Traduzindo:
não há evidência!
Continuemos...
Puxa,
sacanagem você pensa alto:
“Eu acreditei que funcionava,
comprei e usei”.
Pois meu
amigo ou minha amiga, porque não consultou um profissional nutricionista altamente
capacitado para lhe ajudar com a dieta e uso racional de suplementos
esportivos?
Peraí,
tenho mais algumas coisas para te contar.
Um relatório
sobre os suplementos alimentares utilizados no esporte, publicado em 2022 [12]
avaliou 17 produtos. Neste relatório ioimbina nem apareceu na discussão, devido
inexistência de estudos ou de bons estudos para discussão. Traduzindo: não há
evidência!
Continuemos...
E o que
diz o Colégio Americano de Medicina do Esporte (ACSM, American College of Sports Medicine [13]? No capítulo sobre
suplementos alimentares e auxílios ergogênicos, os mesmos foram classificados
em 4 grupos: auxílios ergogênicos que funcionam (creatina, cafeína, bebidas
esportivas, bicarbonato de sódio, suplementos proteicos e alguns aminoácidos);
auxílios ergogênicos que podem funcionar, mas faltam evidências (glutamina,
HMB, colostro e ribose); auxílios ergogênicos que não funcionam (alguns
aminoácidos isolados, pólen de abelha, BCAA, carnitina, picolinato de cromo,
coenzima Q10, ácido linoleico conjugado, Ginseng, inosina, TCM e vanádio); e
auxílios ergogênicos perigosos, proibidos e ilegais (suplementos que contenham
esteroides anabólicos e derivados esteroides ou GH, Tribulus terrestris e Ephedra).
Ou seja, Ioimbina nem entra na discussão pela inexistência de estudos que
comprovem seu uso, eficácia e segurança. Traduzindo: não há evidência!
Continuemos...
E a
Sociedade Internacional de Nutrição Esportiva (INSS, International Society of Sports Nutrition) [14], diz o quê? Entre
suas inúmeras publicações relacionadas ao binômio nutrição e exercício,
encontramos uma revisão da fitoterapia no esporte, incluindo a suplementação de
alcalóides. Ioimbina só aparece ao final
do texto em uma sessão dita “ervas comercializadas com pesquisa limitada”. Em
outras palavras, não existem evidências científicas para indicar o consumo de
ioimbina, ou seja, não há comprovação científica de eficácia e segurança. Sendo
repetitivo: não há evidência!
Continuemos...
CONSIDERAÇÕES
FINAIS:
Em suma,
as alegações fantasiosas e mirabolantes (emagrecedor, queimador de gordura, acelerador
metabólico, termogênico, supressor do apetite, perda de gordura localizada,
entre outras) associadas à Ioimbina carecem totalmente de evidência científica
e, mesmo assim, vem sendo comercializada, prescrita (inacreditável) e usada por
muitos esportivas e atletas, bem como população não atleta que busca
emagrecimento. Existem, obviamente, outras alegações para a utilização desse
alcalóide (por exemplo, como estimulante sexual), mas também existem efeitos
colaterais que estão sendo ignorados pelos usuários (por exemplo, aumento da
pressão arterial e desordens psíquicas). Espero, sinceramente, que este post
abra seus olhos e sua mente, pois crer em Digital Influenciers com milhares de
seguidores, mas nenhuma capacitação e competência profissional é, no mínimo,
muita inocência de sua parte!
REFERÊNCIAS:
1. 1) Ioimbina emagrece? Disponível em:
treinomestre.com.br
2. 2) Ioimbina emagrece? Disponível em:
www.terra.com.br
3. 3) Ioimbina. Disponível em:
www.dicasdetreino.com.br
4. 4) Ioimbina. Disponível em:
www.hipertrofia.org
5. 5) C Kucio, K Jonderko, D Piskorska.
Isr J Med Sci 1991;27(10):550-6
6. 6) Andres Giampreti et al. Clin
Toxicol 2009;47(8):827-9.
7. 7) Mahmound et al. J Evid Based
Complementary Altern Med 2016;21(3):228-34.
8. 8) Aliou et al. Int
Neuropsicofarmacol 2016;30;19(12):pyw068.
9. 9) Evelyne SB et al. Mol Neurobiol
2020;57(10):4202-4217.
1 10) Giovanna Esposito et al. J Food
Prot 2023;86(10):100152.
1 11) Rodrigo Abreu et al. J Int Soc
Sports Nutr 2023;20(1):2236060.
1 12) Roberto Cannataro, Natascia
Straface, Erika Cione. Human Nutrition and Metabolism (Science Direct)
2022;29:200155.
1 13) Medicine & Science in Sports
& Exercise 2009;41(3):709-731. American Dietetic Association (ADA),
Dietitians of Canada (DC), and ACSM.
1 14) Maha S et al. J Int Soc Sports
Nutrition 2018, 15:14.