COMO AUMENTAR OS NÍVEIS DE TESTOSTERONA?
JOELSO PERALTA, Nutricionista, Professor, Palestrante, Mestre em Medicina: Ciências
Médicas e Doutorando: PPG Farmacologia e Terapêutica - UFRGS.
Olá pessoal, tudo bem? Deixa-me falar
seriamente com vocês: “A ciência não
existe para confirmar suas opiniões pessoais, mesmo que você seja um
profissional de renome no mercado de trabalho”. Portanto, entendo que
muitos queiram, realmente, ajudar afirmando que pimenta vermelha,
gengibre, castanha de caju, gergelim, linhaça, ostras, salmão e cafeína
aumentam de forma significativa os níveis de testosterona em homens adultos,
porém não existem estudos que comprovem essa “falácia lógica” (leia Parte 1 - Existem alimentos que aumentam os níveis de testosterona?).
A falácia lógica é um erro de raciocínio
bastante comum, pois os interlocutores misturam fatos verídicos com informações
falsas para estabelecer conclusões erradas com aparência de verdadeiras, ou
seja, você é “fisgado como um peixe” e nem percebe. Em outras palavras, o termo
“falácia” refere-se ao discurso falacioso, falso, enganador, incoerente,
errado. Todavia, torna-se uma “falácia lógica” quando os interlocutores
misturam fatos verdadeiros para confundir você, que acaba acreditando, afinal,
para tão lógico. Deixa-me exemplificar:
“O magnésio é um
mineral essencial para o bom funcionamento do organismo, sendo importante para
a regulação das funções cardíacas e contração muscular. O magnésio participa de
mais de 300 reações bioquímicas em nosso organismo, incluindo a biossíntese de
testosterona pelas células de Leydig dos testículos pelo hormônio luteinizante
(LH). Além disso, as pessoas não consomem quantidades diárias adequadas de
magnésio e, portanto, a suplementação com 1g de magnésio aumenta de forma
significativa os níveis de testosterona livre”.
Que texto legal, não é mesmo?
Um texto extremamente técnico-científico, concorda?
Um texto
convincente, persuasivo, só pode ser verdade?
Imaginem este texto (que inventei agora mesmo) sendo
propagandeado por um profissional de saúde (médico e/ou nutricionista) de
renome, você compraria magnésio neste exato momento?
POIS
É, O TEXTO É FALSO, ENGANADOR, ERRADO!
Trata-se de um exemplo básico de “falácia lógica”.
Como foi dito no último post, sou um cara
CHATO, mas sou HONESTO com meus leitores e, portanto, deixa-me refazer o texto,
porém somente com informações verídicas, verdadeiras, legítimas, honestas:
“O
magnésio é um mineral essencial para o bom funcionamento do organismo, sendo
importante para a regulação das funções cardíacas e contração muscular.
Estima-se que o magnésio participe de mais de 300 reações bioquímicas em nosso
organismo e algumas destas reações podem estar envolvidas com a biossíntese de testosterona.
A testosterona é um hormônio esteroide secretado pelas células de Leydig dos
testículos, cujo biossíntese é regulado pelo hormônio luteinizante (LH). Embora
as pessoas costumam ingerir quantidades diárias inadequadas de magnésio, cujo
dose diária recomendada oscila de 310 a 420 mg/dia para adultos, dependendo do
sexo, não existem estudos que doses excessivas de magnésio (1g ou mais) poderiam
aumentar os níveis de testosterona nos indivíduos. Em uma busca rápida no
PubMed (www.pubmed.ncbi.nlm.nih.gov), usando um filtro de publicação dos
últimos 5 anos, podemos encontrar apenas 16 artigos científicos, cujo grande
maioria envolve estudos do magnésio na Síndrome do Ovário Policístico (SOP) e
câncer de ovário. Outros estudos envolvem animais de experimentação (ratos) e,
portanto, não podemos extrapolar os dados para seres humanos. Por fim, o fato
de uma proteína ou gene, envolvida na cascata de sinalização anabólica e
biossíntese de testosterona, ser dependente de magnésio não significa que a
suplementação de magnésio possa aumentar os níveis de testosterona”.
E,
AGORA, PERCEBEU A DIFERENÇA???
Portanto: prefiro a honestidade do que ilusão!
Com certeza o primeiro texto (falácia lógica) é
mais agradável, especialmente quando concorda com suas expectativas,
convicções, reforçando sua opinião pessoal e a crença no profissional de saúde
“Top das Galáxias”, com milhares de seguidores, que você segue nas redes
sociais. Todavia, viver na ilusão é como viver em um relacionamento, entre duas
pessoas, que já acabou, mas ninguém quer afastar-se. Contudo, mais cedo ou mais
tarde, a decepção baterá em sua porta e perceberá que perdeu tempo demais em
sua vida. Minha sugestão é que você se liberte dessa ilusão, dessa enganação
dos sentidos, e volte a realidade, que aceite os fatos. Neste caso, aceite os
fatos científicos, que buscam encontrar a melhor resposta para as dúvidas das
pessoas e os desafios da complexidade humana.
CHEGA
DE FILOSOFAR, VAMOS A PERGUNTA:
COMO AUMENTAR OS
NÍVEIS DE TESTOSTERONA?
Para uma resposta simples, eu diria:
alimentação, treinamento e sono. Todavia, para uma resposta complexa, eu diria:
leia o texto abaixo!
O que
todos sabem?
A testosterona é um hormônio esteroide
secretado pelas células de Leydig dos testículos, cujo função é promover
efeitos que poderíamos chamar de “masculinizantes”. Ao mesmo tempo, uma pequena
quantidade de andrógenos (testosterona e androstenodiona) pode ser secretada
pela zona reticulosa do córtex adrenal, ou seja, a glândula suprarrenal. Em
homens, os níveis de testosterona oscilam entre 2,5 a 11 mg/dia e, nas
mulheres, os níveis oscilam de 0,2 a 0,4 mg/dia.
Em
adultos do sexo masculino, a regulação para a produção de testosterona se dá
pelo hormônio luteinizante (LH), que estimula justamente as células Leydig dos
testículos. Para tanto, o hipotálamo secreta o hormônio hipotalâmico de
liberação das gonadotrofinas (GnRH), que estimula a hipófise anterior
(adeno-hipófise) quanto a secreção de LH e do hormônio folículo-estimulante
(FSH). O LH, como foi dito, participa da esteroidogênese (formação e secreção
de testosterona), enquanto que o FSH participa da espermatogênese (formação de
espermatozóides). Existe um sistema de retroalimentação (feedback) positivo e negativo nesse processo, por exemplo, a
produção de testosterona pode inibir a adeno-hipófise e hipotálamo. De forma
similar, outro hormônio, chamado inibina, pode interromper a espermatogênese
inibindo o eixo hipotálamo-hipófise.
O que
poucos sabem?
A testosterona tem sua origem em uma estrutura
química conhecida como ciclopentanoperidrofenantreno (CPPF). Vou repetir,
pausadamente, pois é um palavrão: ciclo-pentano-peridro-fenantreno. Trata-se,
portanto, de uma estrutura com quatro anéis (A, B, C e D) e 17 átomos de
carbono chamada. Outros carbonos podem ser adicionados nos carbonos 10 e 13
(C10 e C13), bem como uma cadeia lateral poderia ser ligada no carbono 17 (C17).
Este hidrocarboneto policíclico (CPPF) dá origem ao colesterol (COL). O COL é
um esteroide que, por sua vez, dá origem a uma série de hormônios esteroides,
incluindo a testosterona. Portanto, percebeu onde quero chegar? Ainda não,
então continue a leitura.
O que alguns
sabem, mas esquecem?
O colesterol (COL), inicialmente, dá origem a
pregnenolona, cujo etapa é regulada pelo hormônio adrenocorticotrópico (ACTH)
dependente de adenosina monofosfato cíclico (AMPc), sintetizado pelas células
corticotrópicas da adeno-hipófise. O ACTH pode estimular a glândula suprarrenal
quanto a produção de cortisol e aldosterona. O cortisol é produzido pelo córtex
adrenal, na zona fasciculada, sendo apelidado de “hormônio do estresse”. A
aldosterona é produzida pelo córtex da glândula adrenal, na zona glomerulosa, cujo
função é manter a homeostase do potássio, sódio e hidrogênio dos líquidos
corporais.
Ao mesmo tempo, sob ação do ACTH, a glândula
suprarrenal também produz andrógenos (androgênios). Quer dizer, obtém-se o desidroepiandrosterona
(DHEA), que dá origem à testosterona e androstenodiona. Vejam, todos os
hormônios mencionados (cortisol, aldosterona, DHEA, testosterona e
androstenodiona) tem origem no colesterol (COL). Percebeu, agora, onde quero
chegar? Quase? Então continue a leitura.
O que
quase ninguém sabe?
A pregnenolona, a partir do COL, sofre uma
sequência de reações químicas nas mitocôndrias e no retículo endoplasmático da
célula adrenal, dando origem aos hormônios citados anteriormente. Contudo, as
quantidades realmente expressivas de testosterona circulantes são observadas em
homens, produzidas pelas células de Leydig dos testículos, porém existem dois
períodos distintos de produção: fetal e adultos.
As
células de Leydig fetais produzem altos níveis de andrógenos, que são
necessárias para o desenvolvimento da genitália masculina e “masculinização”
cerebral (quer dizer, desenvolvimento de padrões característicos masculinos).
Após o período pós-natal, ocorre um declínio no número de células de Leydig e,
consequentemente, nos níveis de testosterona. Na juventude, os níveis de
testosterona começam a subir novamente, quando atingem determinado “pico” no
indivíduo adulto jovem ou de meia-idade. No período fetal e inicial da
juventude, não é necessário o LH para o desenvolvimento das células de Leydig,
que simplesmente respondem produzindo testosterona. Tardiamente, contudo, o LH
entra em ação, ligando em receptores nas células de Leydig e produzindo a
testosterona.
Com base nesse conhecimento científico e, na
realidade, de fisiologia neuroendócrina básica, porque jovens e adolescentes
“caem” no uso (e abuso) de esteroides anabólicos sintéticos de testosterona?
Sabendo disso, porque estes jovens buscam “estimuladores” de LH, referidos como
plantas exóticas e/ou medicamentos, para aumentar os níveis de testosterona sem
necessidade alguma? Aliás, porque adultos jovens ou de meia-idade, que
apresentam uma curva ascendente e constante de testosterona, recorrem ao uso (e
abuso) de esteroides anabólico-androgênicos (EAA) para aumentar ainda mais os
níveis de testosterona circulante? Por que promover a inibição do eixo
hipotálamo-hipófise-gonadal com o uso (e abuso) de drogas sintéticas de
testosterona? Ops, isso é um assunto para outro post.
Professor,
onde você quer chegar?
Simples: como você quer níveis ótimos (ou
excelentes) de testosterona se foge do colesterol dietético como o “diabo foge
da cruz”? AHHH, mas você acredita que o colesterol (COL) causa doença
cardiovascular, infarto e derrame, não é mesmo? Pois bem, lembra do que falamos
anteriormente sobre falácia lógica? Em outro post explicarei a “verdade nua e
crua”, digamos assim, do colesterol e aterosclerose, mas agora lembre-se:
A melhor viver na honestidade do que na ilusão!
O COL é importante para a síntese de hormônios
esteroides, incluindo a testosterona. Todavia, a natureza é sábia, ou seja, se
você resolver não ingerir COL na dieta, seu corpo consegue produzi-lo. A
colesterologênese (formação de colesterol) é um processo hepático, assim como a
lipogênese (formação de triglicerídeos). Em resumo, acetil-CoA citossólico
forma acetoacetil-CoA pela tiolase e, em seguida, hidroximetilglutaril-coenzima
A (HMG-CoA) pela HMG-CoA sintase. HMG-CoA sofre uma série de rotas metabólicas,
iniciando pela ação da HMG-CoA redutase, para dar origem ao COL no tecido
hepático. Esse COL pode ser exportado aos tecidos extra-hepáticos com auxílio
da lipoproteína de muito baixa densidade (VLDL). Finalmente, como já visto, o
COL é usado para a biossíntese de testosterona e outros hormônios esteroides.
Portanto, uma dica valiosa: mantenha adequada a
ingestão de lipídeos totais em sua dieta (cerca de 30% do valor energético
total, oscilando entre 25 e 35%), incluindo do COL (300 mg/dia ou mais). É
óbvio, ainda, que precisará de uma adequação em macro e micronutrientes para
manter a saúde e otimizar o cenário metabólico à hipertrofia muscular, mas não
viva de ilusões e “dietas mirabolantes” ou “manipulados milagrosos”.
Caso queira aprofundar seus conhecimentos sobre
a formação, função e regulação da testosterona, aconselho a seguinte leitura: Barry
R. Zirkin e Vassilios Papadopoulos. Leydig cells: formation, function, and
regulation. Biology of Reproduction
99(1): 101-111, 2018 (doi: 10.1093/biolre/ioy059).
Professor,
e o sono e treinamento?
AHHH, claro, mas deixarei para a Parte 3, pois
este texto já está muito longo.
Quando
é aconselhável repor a testosterona?
AHHH, claro, ficará para Parte 3.
O que
você pensa do TRH (terapia de reposição hormonal)?
AHHH, claro, você ganhou. Teremos uma Parte 3.
Lembre-se: se gostou pode compartilhar, desde
que citado a fonte: Prof. Joelso Peralta no Blog:
https://peraltanutri.blogspot.com. AHHH, siga-me nas redes sociais (@peraltanutri). O Programa de
Mentoria Acadêmica e Escrita Científica e o Curso de Nutrição Esportiva Avançada está em construção. Te conto,
em breve!