sexta-feira, 14 de outubro de 2022

COMO AUMENTAR OS NÍVEIS DE TESTOSTERONA?

 

COMO AUMENTAR OS NÍVEIS DE TESTOSTERONA?

(Parte 2) 

JOELSO PERALTA, Nutricionista, Professor, Palestrante, Mestre em Medicina: Ciências Médicas e Doutorando: PPG Farmacologia e Terapêutica - UFRGS.

 


Olá pessoal, tudo bem? Deixa-me falar seriamente com vocês: A ciência não existe para confirmar suas opiniões pessoais, mesmo que você seja um profissional de renome no mercado de trabalho. Portanto, entendo que muitos queiram, realmente, ajudar afirmando que pimenta vermelha, gengibre, castanha de caju, gergelim, linhaça, ostras, salmão e cafeína aumentam de forma significativa os níveis de testosterona em homens adultos, porém não existem estudos que comprovem essa “falácia lógica” (leia Parte 1 - Existem alimentos que aumentam os níveis de testosterona?). 

A falácia lógica é um erro de raciocínio bastante comum, pois os interlocutores misturam fatos verídicos com informações falsas para estabelecer conclusões erradas com aparência de verdadeiras, ou seja, você é “fisgado como um peixe” e nem percebe. Em outras palavras, o termo “falácia” refere-se ao discurso falacioso, falso, enganador, incoerente, errado. Todavia, torna-se uma “falácia lógica” quando os interlocutores misturam fatos verdadeiros para confundir você, que acaba acreditando, afinal, para tão lógico. Deixa-me exemplificar:

 

“O magnésio é um mineral essencial para o bom funcionamento do organismo, sendo importante para a regulação das funções cardíacas e contração muscular. O magnésio participa de mais de 300 reações bioquímicas em nosso organismo, incluindo a biossíntese de testosterona pelas células de Leydig dos testículos pelo hormônio luteinizante (LH). Além disso, as pessoas não consomem quantidades diárias adequadas de magnésio e, portanto, a suplementação com 1g de magnésio aumenta de forma significativa os níveis de testosterona livre”.

 

Que texto legal, não é mesmo?

Um texto extremamente técnico-científico, concorda?

 Um texto convincente, persuasivo, só pode ser verdade?

Imaginem este texto (que inventei agora mesmo) sendo propagandeado por um profissional de saúde (médico e/ou nutricionista) de renome, você compraria magnésio neste exato momento?

 

POIS É, O TEXTO É FALSO, ENGANADOR, ERRADO!

Trata-se de um exemplo básico de “falácia lógica”.

 

Como foi dito no último post, sou um cara CHATO, mas sou HONESTO com meus leitores e, portanto, deixa-me refazer o texto, porém somente com informações verídicas, verdadeiras, legítimas, honestas:

 

“O magnésio é um mineral essencial para o bom funcionamento do organismo, sendo importante para a regulação das funções cardíacas e contração muscular. Estima-se que o magnésio participe de mais de 300 reações bioquímicas em nosso organismo e algumas destas reações podem estar envolvidas com a biossíntese de testosterona. A testosterona é um hormônio esteroide secretado pelas células de Leydig dos testículos, cujo biossíntese é regulado pelo hormônio luteinizante (LH). Embora as pessoas costumam ingerir quantidades diárias inadequadas de magnésio, cujo dose diária recomendada oscila de 310 a 420 mg/dia para adultos, dependendo do sexo, não existem estudos que doses excessivas de magnésio (1g ou mais) poderiam aumentar os níveis de testosterona nos indivíduos. Em uma busca rápida no PubMed (www.pubmed.ncbi.nlm.nih.gov), usando um filtro de publicação dos últimos 5 anos, podemos encontrar apenas 16 artigos científicos, cujo grande maioria envolve estudos do magnésio na Síndrome do Ovário Policístico (SOP) e câncer de ovário. Outros estudos envolvem animais de experimentação (ratos) e, portanto, não podemos extrapolar os dados para seres humanos. Por fim, o fato de uma proteína ou gene, envolvida na cascata de sinalização anabólica e biossíntese de testosterona, ser dependente de magnésio não significa que a suplementação de magnésio possa aumentar os níveis de testosterona”.  

 

E, AGORA, PERCEBEU A DIFERENÇA???

Portanto: prefiro a honestidade do que ilusão!

 

Com certeza o primeiro texto (falácia lógica) é mais agradável, especialmente quando concorda com suas expectativas, convicções, reforçando sua opinião pessoal e a crença no profissional de saúde “Top das Galáxias”, com milhares de seguidores, que você segue nas redes sociais. Todavia, viver na ilusão é como viver em um relacionamento, entre duas pessoas, que já acabou, mas ninguém quer afastar-se. Contudo, mais cedo ou mais tarde, a decepção baterá em sua porta e perceberá que perdeu tempo demais em sua vida. Minha sugestão é que você se liberte dessa ilusão, dessa enganação dos sentidos, e volte a realidade, que aceite os fatos. Neste caso, aceite os fatos científicos, que buscam encontrar a melhor resposta para as dúvidas das pessoas e os desafios da complexidade humana.

 

CHEGA DE FILOSOFAR, VAMOS A PERGUNTA:

COMO AUMENTAR OS NÍVEIS DE TESTOSTERONA?

 

Para uma resposta simples, eu diria: alimentação, treinamento e sono. Todavia, para uma resposta complexa, eu diria: leia o texto abaixo!


O que todos sabem?

A testosterona é um hormônio esteroide secretado pelas células de Leydig dos testículos, cujo função é promover efeitos que poderíamos chamar de “masculinizantes”. Ao mesmo tempo, uma pequena quantidade de andrógenos (testosterona e androstenodiona) pode ser secretada pela zona reticulosa do córtex adrenal, ou seja, a glândula suprarrenal. Em homens, os níveis de testosterona oscilam entre 2,5 a 11 mg/dia e, nas mulheres, os níveis oscilam de 0,2 a 0,4 mg/dia. 

 Em adultos do sexo masculino, a regulação para a produção de testosterona se dá pelo hormônio luteinizante (LH), que estimula justamente as células Leydig dos testículos. Para tanto, o hipotálamo secreta o hormônio hipotalâmico de liberação das gonadotrofinas (GnRH), que estimula a hipófise anterior (adeno-hipófise) quanto a secreção de LH e do hormônio folículo-estimulante (FSH). O LH, como foi dito, participa da esteroidogênese (formação e secreção de testosterona), enquanto que o FSH participa da espermatogênese (formação de espermatozóides). Existe um sistema de retroalimentação (feedback) positivo e negativo nesse processo, por exemplo, a produção de testosterona pode inibir a adeno-hipófise e hipotálamo. De forma similar, outro hormônio, chamado inibina, pode interromper a espermatogênese inibindo o eixo hipotálamo-hipófise.

 

O que poucos sabem?

A testosterona tem sua origem em uma estrutura química conhecida como ciclopentanoperidrofenantreno (CPPF). Vou repetir, pausadamente, pois é um palavrão: ciclo-pentano-peridro-fenantreno. Trata-se, portanto, de uma estrutura com quatro anéis (A, B, C e D) e 17 átomos de carbono chamada. Outros carbonos podem ser adicionados nos carbonos 10 e 13 (C10 e C13), bem como uma cadeia lateral poderia ser ligada no carbono 17 (C17). Este hidrocarboneto policíclico (CPPF) dá origem ao colesterol (COL). O COL é um esteroide que, por sua vez, dá origem a uma série de hormônios esteroides, incluindo a testosterona. Portanto, percebeu onde quero chegar? Ainda não, então continue a leitura.

 

O que alguns sabem, mas esquecem?

O colesterol (COL), inicialmente, dá origem a pregnenolona, cujo etapa é regulada pelo hormônio adrenocorticotrópico (ACTH) dependente de adenosina monofosfato cíclico (AMPc), sintetizado pelas células corticotrópicas da adeno-hipófise. O ACTH pode estimular a glândula suprarrenal quanto a produção de cortisol e aldosterona. O cortisol é produzido pelo córtex adrenal, na zona fasciculada, sendo apelidado de “hormônio do estresse”. A aldosterona é produzida pelo córtex da glândula adrenal, na zona glomerulosa, cujo função é manter a homeostase do potássio, sódio e hidrogênio dos líquidos corporais.

Ao mesmo tempo, sob ação do ACTH, a glândula suprarrenal também produz andrógenos (androgênios). Quer dizer, obtém-se o desidroepiandrosterona (DHEA), que dá origem à testosterona e androstenodiona. Vejam, todos os hormônios mencionados (cortisol, aldosterona, DHEA, testosterona e androstenodiona) tem origem no colesterol (COL). Percebeu, agora, onde quero chegar? Quase? Então continue a leitura.


O que quase ninguém sabe?

A pregnenolona, a partir do COL, sofre uma sequência de reações químicas nas mitocôndrias e no retículo endoplasmático da célula adrenal, dando origem aos hormônios citados anteriormente. Contudo, as quantidades realmente expressivas de testosterona circulantes são observadas em homens, produzidas pelas células de Leydig dos testículos, porém existem dois períodos distintos de produção: fetal e adultos.

  As células de Leydig fetais produzem altos níveis de andrógenos, que são necessárias para o desenvolvimento da genitália masculina e “masculinização” cerebral (quer dizer, desenvolvimento de padrões característicos masculinos). Após o período pós-natal, ocorre um declínio no número de células de Leydig e, consequentemente, nos níveis de testosterona. Na juventude, os níveis de testosterona começam a subir novamente, quando atingem determinado “pico” no indivíduo adulto jovem ou de meia-idade. No período fetal e inicial da juventude, não é necessário o LH para o desenvolvimento das células de Leydig, que simplesmente respondem produzindo testosterona. Tardiamente, contudo, o LH entra em ação, ligando em receptores nas células de Leydig e produzindo a testosterona.

Com base nesse conhecimento científico e, na realidade, de fisiologia neuroendócrina básica, porque jovens e adolescentes “caem” no uso (e abuso) de esteroides anabólicos sintéticos de testosterona? Sabendo disso, porque estes jovens buscam “estimuladores” de LH, referidos como plantas exóticas e/ou medicamentos, para aumentar os níveis de testosterona sem necessidade alguma? Aliás, porque adultos jovens ou de meia-idade, que apresentam uma curva ascendente e constante de testosterona, recorrem ao uso (e abuso) de esteroides anabólico-androgênicos (EAA) para aumentar ainda mais os níveis de testosterona circulante? Por que promover a inibição do eixo hipotálamo-hipófise-gonadal com o uso (e abuso) de drogas sintéticas de testosterona? Ops, isso é um assunto para outro post.


Professor, onde você quer chegar?

Simples: como você quer níveis ótimos (ou excelentes) de testosterona se foge do colesterol dietético como o “diabo foge da cruz”? AHHH, mas você acredita que o colesterol (COL) causa doença cardiovascular, infarto e derrame, não é mesmo? Pois bem, lembra do que falamos anteriormente sobre falácia lógica? Em outro post explicarei a “verdade nua e crua”, digamos assim, do colesterol e aterosclerose, mas agora lembre-se:

 

A melhor viver na honestidade do que na ilusão!

 

O COL é importante para a síntese de hormônios esteroides, incluindo a testosterona. Todavia, a natureza é sábia, ou seja, se você resolver não ingerir COL na dieta, seu corpo consegue produzi-lo. A colesterologênese (formação de colesterol) é um processo hepático, assim como a lipogênese (formação de triglicerídeos). Em resumo, acetil-CoA citossólico forma acetoacetil-CoA pela tiolase e, em seguida, hidroximetilglutaril-coenzima A (HMG-CoA) pela HMG-CoA sintase. HMG-CoA sofre uma série de rotas metabólicas, iniciando pela ação da HMG-CoA redutase, para dar origem ao COL no tecido hepático. Esse COL pode ser exportado aos tecidos extra-hepáticos com auxílio da lipoproteína de muito baixa densidade (VLDL). Finalmente, como já visto, o COL é usado para a biossíntese de testosterona e outros hormônios esteroides.

Portanto, uma dica valiosa: mantenha adequada a ingestão de lipídeos totais em sua dieta (cerca de 30% do valor energético total, oscilando entre 25 e 35%), incluindo do COL (300 mg/dia ou mais). É óbvio, ainda, que precisará de uma adequação em macro e micronutrientes para manter a saúde e otimizar o cenário metabólico à hipertrofia muscular, mas não viva de ilusões e “dietas mirabolantes” ou “manipulados milagrosos”.  

Caso queira aprofundar seus conhecimentos sobre a formação, função e regulação da testosterona, aconselho a seguinte leitura: Barry R. Zirkin e Vassilios Papadopoulos. Leydig cells: formation, function, and regulation. Biology of Reproduction 99(1): 101-111, 2018 (doi: 10.1093/biolre/ioy059).

 

Professor, e o sono e treinamento?

AHHH, claro, mas deixarei para a Parte 3, pois este texto já está muito longo.

Quando é aconselhável repor a testosterona?

AHHH, claro, ficará para Parte 3.

O que você pensa do TRH (terapia de reposição hormonal)?

AHHH, claro, você ganhou. Teremos uma Parte 3.

 

Lembre-se: se gostou pode compartilhar, desde que citado a fonte: Prof. Joelso Peralta no Blog: https://peraltanutri.blogspot.com. AHHH, siga-me nas redes sociais (@peraltanutri). O Programa de Mentoria Acadêmica e Escrita Científica e o Curso de Nutrição Esportiva Avançada está em construção. Te conto, em breve!