sexta-feira, 3 de setembro de 2021

O uso de máscaras na Covid-19: úteis ou inúteis?

 


O uso de máscaras na Covid-19: 

úteis ou inúteis?

 

Olá, tudo bem? O uso de máscaras faciais na pandemia de Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2), ainda tem gerado discussões fervorosas entre os profissionais de saúde e a população em geral. As próprias autoridades de saúde, por vezes, exibem recomendações conflitantes que acabam deixando mais margem para desconfiança. Sabe-se que a máscara facial é apenas UMA das medidas de proteção contra a Covid-19, que protege você e as pessoas ao seu redor, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). As outras medidas de proteção incluem o distanciamento social, a ato de não aglomerar, a boa ventilação ambiental e a limpeza das mãos com água e sabão e álcool em gel. É óbvio, portanto, que a máscara facial ISOLADAMENTE não faz “milagres”, mas pode ser considerada uma “barreira física” ou uma “espécie de escudo de proteção” no cenário da pandemia. Aliás, as etiquetas de BOA EDUCAÇÃO, como não tossir ou espirrar na cara das pessoas, não circular sem máscaras onde todos estão de máscaras, respeitar o distanciamento social nos locais comerciais também são bem-vindos.

Ao mesmo tempo, surgem alegações para o NÃO USO de máscaras faciais, sendo algumas anedóticas (que revelam a ignorância das pessoas sobre a ciência básica) e outras são ridículas e infantilóides (que, talvez, deveriam ser, simplesmente, ignoradas). Todavia, existem algumas alegações interessantes e reflexivas (que merecem respeito e o devido esclarecimento). Entretanto, para os negacionistas, que diferem dos ceticistas, qualquer argumento poderá não surtir efeito e só vai alimentar um discurso de ódio (dica: não perca seu tempo). Sendo assim, não seja “do contra” e faça as perguntas certas:

O uso de máscaras faciais na Covid-19 é útil ou inútil? As máscaras protegem as pessoas quanto a transmissão do vírus? Somente profissionais de saúde e de apoio que prestam assistência aos pacientes deveriam usar máscaras? As máscaras são desnecessárias para pessoas saudáveis? O que é FATO e o que é FAKE? O que são fatos com embasamento científico e o que não passam de simples falácia confusa e mentirosa? Qual diferença entre gotículas respiratórias e aerossois no contexto do novo coronavírus e pandemia? Todas as máscaras são iguais? Que máscaras selecionar? O que sabemos sobre o uso de máscaras durante a atividade física? Crianças também devem usar máscaras? Estamos no momento oportuno de abandonar as máscaras faciais? Você quer entender, realmente, o assunto ou prefere acreditar cegamento em seu “doutor” preferido e famoso das redes sociais? Enfim, são muitas dúvidas que ainda persistem sobre o uso de máscaras faciais na pandemia de Covid-19.

O objetivo deste post, portanto, é elucidar essa temática através de um “textão” (sim, gosto de escrever e não gosto de respostas simples que podem gerar pensamentos levianos). Este Blog traz informações de caráter científico na área de saúde e, portanto, não pense que irei falar apenas de frango, batata-doce e Whey Protein (brincadeirinha, rsrs), pois a dicusssão sobre o uso de máscaras é MUNDIAL. O “textão” aproxima a linguagem científica ao público leigo, pois conhecimento científico entre quatro paredes não tem serventia. Ao mesmo tempo, o “textão” tem forte apoio na fisiologia, bioquímica e imunologia e, dessa forma, a leitura pode não ser acessível a todos. Espero, contudo, vencer a linguagem científica rebuscada para atingir um grande número de leitores. Boa leitura!

 

Introdução

Segundo Dra. Natália Pasternak Taschner (ID Currículo Lattes: 2971054847583007), bióloga, professora, pesquisadora, Doutora e Pós-Doutora em Microbiologia:

“As pessoas não usam máscaras. Gente, é uma porra de um pedaço de pano na cara. Por que as pessoas não usam máscaras? Usar máscaras é o mínimo de respeito para com as outras pessoas”.

Assim como a Dra. Natália Pasternak, muitos cientistas, pesquisadores e professores argumentam sobre a importância do uso de máscaras, mas muitas pessoas preferem acreditar na “Ciência do Instagram”, no “Tiozão do FACE” ou na “Titia do WhatsApp”. Dessa forma, surgem alegações anedóticas, ridículas e infantilizadas para o NÃO USO das máscaras faciais, tais como:

 “As máscaras têm apenas a serventia de acumular bactérias e outras impurezas, não impedem a propagação do vírus”.

“As máscaras escondem o sorriso das pessoas e só servem para controlar a população”.

“As máscaras só servem para causar pânico, são cabrestros para controlar as pessoas”.

 

Outras alegações para o NÃO USO de máscaras revelam a ignorância das pessoas sobre a ciência básica e, portanto, merecem esclarecimentos:

 “As máscaras deixam as pessoas sem oxigênio (O2) e acumulam dióxido de carbono (CO2) no cérebro e no sangue”.

“As máscaras acidificam o sangue das pessoas e favorecem a doença”.

 

Quando falamos em ignorância das pessoas não estamos sendo ofensivos, pois ignorância é desconhecimento dos fatos, da funcionalidade das coisas, da ocorrência de algo. Por exemplo, sou um completo ignorante em física quântica e, portanto, vou procurar um físico para me explicar os fenômenos atômicos que desconheço antes de sair transmitindo informações aos colegas, amigos e parentes. Também tenho total ignorância sobre os planetas, cosmos e universo e, dessa forma, não vou sair “batendo boca” com um astrofísico sobre o assunto que desconheço. Tenho ignorância sobre a mecânica de um automóvel e, por isso, tenho meu mecânico de confiança. Quando meu computador apresenta algum defeito ou falha vou procurar um técnico de informática, afinal sou ignorante neste assunto. Se minha geladeira parar de funcionar vou procurar uma assistência técnica, pois minha ignorância não permite identificar o problema. É simples assim: “Todos somos ignorantes, mas em assuntos diferentes”.

Neste sentido, ser ignorante não é vergonhoso, pois o ignorante aceita o fato de não saber e, portanto, está disposto a procurar auxílio e aprender. Podemos dizer, portanto, que a “ignorância não é uma prisão”, desde que você aceite a opinião dos especialistas sobre o assunto, alguns dos quais passaram décadas (ou a vida toda) estudando o assunto. Além disso, a ignorância não tem nada a ver com burrice, até porquê o burro não sabe que é burro. Por exemplo, apoiar o racismo é burrice, ser anti-vacinação é burrice e, mesmo assim, o burro tem salvação se aceitar ser salvo. Porém, temos um grande problema: quando os discursos antimáscaras e antivacinas são realizados por “doutores”, ou seja, profissionais de saúde. Este fato, por si só, tente a dar um verdadeiro “nó na cabeça” da população em geral, pois são “doutores” (muitos, na realidade, sem doutorado, sem mestrado, sem especialização, sem experiência de pesquisa, sem experiência docente).  

Sendo assim, na frase “As máscaras têm apenas a serventia de acumular bactérias e outras impurezas”, poderíamos responder que uma boa lavagem com água e sabão resolveria o problema ao invés de deixar suas máscaras penduradas no retrovisor dos carros (isso lhe parece familiar?). Quer dizer, no passado as pessoas penduravam no retrovisor do carro o terço (símbolo religioso católico, que representa um instrumento de reza); emblemas do time de futebol preferido (sou gremista, mas sem fanatismo); e, até mesmo, ursinhos de pelúcia (tá, essa estou fora), mas atualmente vemos penduradas no retrovisor máscaras faciais dos mais diferentes tipos, estampas, tamanhos e cores.

Já na frase “As máscaras deixam as pessoas sem oxigênio (O2), acumulam dióxido de carbono (CO2), acidificam o sangue”, poderíamos indicar um bom livro de bioquímica ou fisiologia básica, onde tem um excelente capítulo sobre sistemas tampão ou de tamponamento biológico. Estudem, leiam, é “tribão”. E se, por um momento, ingerir um refrigerante com pH 2,5 não se preocupe em ter uma morte fulminante por acidificação do pH sanguíneo, pois como diria o Padre Quevedo (cujo nome verdadeiro é Óscar González-Quevedo Bruzón, um parapsicólogo brasileiro): “Isto Non Ecziste”.

Porém, na frase “As máscaras escondem o sorriso das pessoas, causam pânico e são cabrestros para controlar as pessoas” a coisa está ficando muito séria e pode requerer a procura, urgente, de um psicólogo ou psiquiatra, pois as máscaras estão dominando você. Como diria Dra. Natália Pasternak: “Gente, é uma porra de um pedaço de pano na cara”. Uma solução seria “sorria com os olhos” ao usar máscaras, afinal dizem que “os olhos são as janelas da alma” (acho que não “colou”, mas tentei). Se tem pânico de máscaras faciais, então procure um gastroenterologista, pois pode haver um distúrbio esofágico ou de refluxo não diagnosticado (tentei novamente, mas sei que não “colou”).

O fato é: alegações anedóticas, estapafúrdias, ridículas, “sem pé e nem cabeça”, aberrações e falácias ilógicas, discursos infantilóides para o NÃO USO de máscaras faciais não merecem a perda de nosso tempo e esforço e, portanto, devem ser ignoradas. Todavia, na frase “Máscaras não impedem a propagação do vírus” merece atenção e uma resposta digna.

 

AS MÁSCARAS FACIAIS SÃO ÚTEIS OU INÚTEIS EM TEMPOS DE PANDEMIA?

O novo coronavírus (SARS-CoV-2) da Covid-19 se transmite, entre as pessoas, através de gotículas respiratórias (que são expelidas quando a pessoa conversa, tosse ou espirra) e através de vias de contato (boca, nariz e olhos). Dessa forma, a lógica das máscaras faciais é bem simples: são “barreiras físicas” capazes de evitar que as gotículas no ar, contendo o vírus, chegue até você ou que você propague tais gotículas para os outros. Não precisamos ser grandes cientistas, pesquisadores ou estudiosos para entender isso, pois é algo simples e evidente. Para melhor entendimento, as máscaras faciais são uma espécie de “escudo de proteção” em um cenário de guerra, mas por vezes algum guerrilheiro acaba ficando ferido ou morrendo.

O uso de máscaras faciais não é uma novidade na pandemia de Covid-19, pois profissionais de saúde, especialmente em ambiente hospitalar, já fazem seu uso por décadas e décadas. Já fui supervisor de estágio clínico obrigatório de alunos em graduação em uma Instituição de Ensino Supeior (EIS), onde o uso de máscaras faciais, antes da pandemia, era algo comum em alguns ambientes. Aliás, em projetos de pesquisa que participei, onde havia pessoas imunusuprimidas por doenças debilitantes, o uso de máscaras faciais, antes da pandemia, também era algo comum e sem grande estresse. Aliás, o uso de máscaras faciais também se tornou prevalente por pessoas que vivem em países asiáticos (China e Vietnã) e seu uso popularizou-se com surto de influenza H1N1 (2009), SARS (2002), MERS (2012) e Ébola (maior surto em 2014, embora identificado primeira vez em 1976). A OMS destaca que o uso de máscaras na Covid-19 é uma medida é fundamental para suprimir a transmissão do vírus e salvar vidas. Porém, não adianta, pois existem pessoas que são do “contra” simplesmente por que são do “contra”. Neste sentido, vamos aprofundar um pouco mais o assunto.

Quando uma pessoa fala, tosse ou espirra são liberados milhares de gotículas respiratórias no ar, que possuem diferentes tamanhos (10 até 500 micrômetros) e que podem, portanto, conter partículas virais infecciosas, incluindo o SARS-CoV-2. As grandes partículas respiratórias (acima de 200 micrômetros) caem rapidamente no chão (1 até 2 segundos), ou seja, permanecem poucos segundo no ar. De acordo com Samir Elian (ID Currículo Lattes: 5819780474225967), biólogo, MSc, PhD em microbiologia em seu texto no Blog da Unicamp (blogs.unicamp.br/covid-19), uma grande gotícula de 100 micrômetros cai no chão em 4,6 segundos e pode percorrer uma distância de até 2,5 metros. Vou repetir, pois é importante: “A gotícula de 100 micrômetros pode percorrer uma distância de até 2,5 metros”. Agora, imaginem se a partícula viral estiver dentro desta gotícula e os dois interlocutores (um deles pode ser você) estiverem sem máscaras, o que me diz?

Já as pequenas partículas (10 até 20 micrômetros) permanecem no ar longos períodos (minutos e horas) e, por isso, usa-se o termo aerossol. Na realidade, partículas menores que 10 micrômetros já são chamadas de aerossóis por alguns pesquisadores, enquanto que para outros são aerosóis aquelas menores que 5 micrômetros. Porém, essa discussão não é novidade para ninguém, pois essas partículas respiratórias e aerossóis são estudadas desde a década de 30, por exemplo: Lange B; Keschischian KK. Z Hyg InfektKr, 104-256, 1925 (https://journals.sagepub.com/doi/pdf/10.1177/003591576405700329) e Wells WF. Amer J Hyg, 20, 611, 1934 (https://academic.oup.com/aje/article-abstract/20/3/611/280025?redirectedFrom=fulltext). O problema, claro, é que as pessoas não lêem os estudos originais na íntegra, mas adoram compartilhar “posts” do “Tiozão do FACE” ou da “Titia do WhatsApp”.

O biológo, MSc, PhD Samir Elian, já mencionado, destaca no Blog da Unicamp (blogs.unicamp.br/covid-19) que uma partícula de aerossol de 1 micrômetro pode permanecer no ar por cerca de 12 horas, onde através da tosse e do espirro, as mesmas podem ser lançadas por mais de 6 metros. Vou repetir: “Aerossol de 1 micrômetro pode permanecer no ar por 12 horas e ser lançado por mais de 6 metros”. Agora, ao correr ou pedalar em sua bicicleta com seus colegas, mantém a distância adequada? Outros estudiosos relatam que 3 a 6 horas (e não 12 horas) seria o tempo de permanência dos aerossois no ambiente, o que também depende se o ambiente é ventilado ou não; se o ambiente é pequeno ou grande; quantas pessoas estavam presentes no ambiente; qual o tempo de permanência das pessoas no ambiente; entre outros fatores.     

Enfim, aerossóis são pequeníssimas partículas (menores que 5 ou 10 micrômetros) que podem permanecer no ar por minutos e, até mesmo, horas. Algumas partículas de 5,5 micrômetros, por exemplo, podem ser encontradas no trato respiratório superior (cavidade nasal), enquanto que partículas ainda menores (1,5 micrômetros ou menos) são depositadas nos alvéolos pulmonares (Hatch TF. Aerobiology, Washington DC Amer Ass Adv Sci., 1942; e Luciana M.P.A. Tese de Doutorado, PPG Engenheria Biomédica, Curitiba, 2018).

Todavia, é interessante destacar que os aerossóis estão sujeitos às “Leis da Física” e, portanto, podemos verificar sua permanência no ar e sua trajetória. Por exemplo, um estudo publicado na The New England Journal of Medicine em 2020 (Philip Anfinrud et al. Visualizing Speech-Generated Oral Fluid Droplets with Laser Light Scattering. N Engl J Med 382: 2061-2063, 2020) conseguiu visualizar e registrar em vídeo (com laser verde de 532 nanômetros) a trajetória das gotículas respiratórias durante a fala normal e forçada, com e sem o uso de máscaras. Neste experimento, o uso de máscaras reduziu muito o número de gotículas respiratórias.

Enfim, para “não perder o fio da meada”, uma pausa:

As gotículas respiratórias e aerossois, que ficam suspensas no ar, podem conter partículas virais, incluindo o SARS-CoV-2. Neste sentido, é óbvio que as máscaras faciais funcionam como “barreiras físicas” ou “escudos de proteção” para reduzir a transmissão viral. Então, SIM, as máscaras faciais na Covid-19 são úteis e parecem cumprir seu papel. Além disso, as máscaras faciais protegem as pessoas quanto a transmissão do vírus, embora seja apenas uma das medidas de proteção na pandemia.

Porém, surgem as perguntas: Todas as máscaras faciais são iguais? Todas as máscaras protegem as pessoas? Quais são mais eficazes e porquê? São ótimas perguntas, então respire fundo e aguarde a PARTE 2 deste “textão”, onde entenderemos o tamanho das bactérias e vírus (incluindo o SARS-CoV-2), bem como o mecanismo de filtração das máscaras faciais. Veremos, também, o conceito de carga viral ambiental e as diferentes máscaras faciais buscando a mais adequada no contexto da pandemia de Covid-19.